Paixão nacional

A pátria de chuteiras

É quase como se cada jogador desses fosse um embaixador de nossa alegria

Natalino Salgado Filho - Doutor em Nefrologia, ex-reitor da UFMA, membro do IHGM, da AMM, AMC e AML

Atualizada em 11/10/2022 às 12h37

“O futebol é passional porque é jogado pelo pobre ser humano”. Começo este texto com uma frase do inesquecível Nelson Rodrigues por duas razões: 1. Na semana passada, quarta-feira, celebrou-se o Dia Nacional do Futebol, comemoração que acontece desde 1976. 2. No Rio de Janeiro e em São Paulo, e em menor escala em outros estados, com grandes times e torcidas, a violência, antes e após os jogos, fora e dentro dos campos, tem mostrado uma triste realidade na cena futebolística nacional.

Retomando a frase rodrigueana, creio que concordaremos que paixão é palavra que define e está intimamente ligada ao torcer por um time, mas suspeito, a julgar pelos campos de batalha mostrados nos jornais, algo mais que paixão está em jogo. Ou haverá uma paixão distorcida e adoecida que serve de esteio às manifestações mais baixas dos torcedores que se envolvem com violência?

Imagino Nelson se referindo à passionalidade que ele mesmo tinha, como uma força motivadora, manifesta em alegria, no entusiasmo como quando disse: “Uma torcida não vale a pena pela sua expressão numérica. Ela vive e influi no destino das batalhas pela força do sentimento. E a torcida tricolor leva um imperecível estandarte de paixão”.

Celebrar a paixão por um time, seguindo o maior cronista brasileiro, é exprimir sentimentos, usar o grito de gol como uma benéfica catarse. É encantar-se com o drible, o inesperado “elástico”, o chapéu, o cruzamento inacreditável que desafia as leis da física. Ou a salvadora mão que complementa o arco feito pelo nosso goleiro que, num segundo, nos retira da derrota. É ouvir aquele enorme uuuhhhh quando a bola, caprichosa, passa apenas de raspão na trave, mas que de nosso ângulo da arquibancada quase se viu a rede estufada.

Bem, ainda é assim em muitos momentos, mas também temos visto cenas dantescas de invasão de campo, agressões a policiais por jogadores e torcedores que queriam apenas ver uma partida que é algo que todos deveriam experimentar pelo menos uma vez na vida. A partida para estes torcedores violentos é mera desculpa. Eles, em gangues, aguardam ansiosos o momento de agredir, como se jogassem um esporte diabólico, cujo objetivo é ferir quem quer que seja.

O Brasil, como nenhum outro país, não somente ama o futebol, produziu os maiores craques que o mundo já viu. Não há campeonato nas mais importantes ligas do mundo, que não tenha um brasileiro fazendo a alegria de suas torcidas. É quase como se cada jogador desses fosse um embaixador de nossa alegria, nossa ginga, nossa esperteza inocente, como a do célebre Garrincha com suas pernas tortas capazes de dribles inusitados. Eu mesmo, integrante da imensa nação rubro negra, sou fã do bailado que jogadores e bola são capazes de protagonizar. O melhor do futebol e o mais sadio é o drible imprevisível, o lance inesperado e o gol que nasce daí.

O futebol ainda é alegria, mas a sociedade brasileira não pode mais suportar que a cada certame a violência roube a cena e macule uma das mais genuínas formas de lazer, que o brasileiro de todas as classes pode ter.

A data escolhida para o dia do futebol é uma homenagem ao Sport Club Rio Grande, primeiro time formado no Brasil, no alvorecer do século XX. O time existe até hoje e joga na segunda divisão gaúcha. A paz e a alegria que o futebol proporciona devem ser o espetáculo de sempre. A violência, a exceção que deve ser sempre combatida e banida.

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