Donato Brandão

STJ rejeita habeas corpus a fundador de seita religiosa do Maranhão

Grupo é acusado pelo Ministério Público de ter castrado jovens, além de outros crimes; líder foi condenado a 28 anos de prisão em regime fechado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h38
Imagem de Donato Brandão, fundador da seita religiosa no Maranhão
Imagem de Donato Brandão, fundador da seita religiosa no Maranhão (Imagem de Donato Brandão, fundador da seita religiosa no Maranhão)

BRASÍLIA - O Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou um pedido de habeas corpus apresentado pela defesa do fundador de uma seita religiosa do Maranhão autodenominada brandanismo. Donato Brandão é acusado de promover a castração de jovens e de ter cometido outros crimes. A decisão foi tomada pela Quinta Turma da Corte.

No início do processo, o Ministério Público apresentou denúncia de prática de lesão corporal gravíssima, estelionato, atentado ao pudor, alteração de registro, falsificação de documento público e falsidade ideológica. A série de crimes ocorreu há 18 anos no Maranhão e gerou condenação de 28 anos em regime fechado ao líder da seita, que se apresentava como “entidade filantrópica”. Em São Luís, ele deixou a prisão em 2010, em liberdade condicional.

O relator da ação, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, apontou que os questionamentos se referem a ação penal iniciada em 1999 e cuja condenação transitou em julgado em 2004. Assim, eventual nulidade absoluta não pode mais repercutir sobre a realidade processual, protegida pelo instituto da coisa julgada.

O habeas corpus impetrado no STJ defendeu a necessidade de anulação da ação penal por esta ter sido, supostamente, pautada em inúmeras nulidades, como invasão de domicílio, violação do princípio do juiz natural e do promotor natural, incomunicabilidade do réu, indeferimento de diligências, tortura de testemunhas, interrogatório de menores sem curador, incompetência da Justiça estadual e outras.

O relator não considerou viável a análise de nulidade do processo, pois a maioria dos temas não foi apreciada pelo tribunal de origem, o que impede o STJ de se manifestar a respeito, sob pena de supressão de instância.

Preclusão

A defesa alegava perseguição contra o réu, mas o relator observou que o habeas corpus foi apresentado 12 anos após o trânsito em julgado da condenação, o que “revela a preclusão até mesmo de eventuais nulidades absolutas”. Sobre a alegada incompetência do juízo que determinou a busca e apreensão e a prisão cautelar, Fonseca disse que, da mesma forma, não foi alegada pela defesa no momento oportuno.

No ponto em que a defesa sustentou irregularidade por incomunicabilidade, o relator concluiu não ser possível afirmar, pelo que consta dos autos, que o condenado foi privado de ter contato com seus advogados, “tendo-se observado, portanto, seu direito à ampla defesa”.

Para o ministro, não há qualquer utilidade nessa linha apresentada pela defesa do fundador da seita do Maranhão, até porque a suposta incomunicabilidade teria ocorrido durante o inquérito e, segundo a jurisprudência, eventuais irregularidades na fase investigatória não contaminam a ação penal. O voto do relator foi seguido pelos demais membros da turma.

Preso em Petrópolis

Condenado em São Luís por mutilar a genitália de três jovens do sexo masculino na década de 1990, Donato Brandão Costa, o pai Donato, líder da Seita Mundial (Moderna Unidade Normativa de Desenvolvimento Intelectual da América Latina), foi preso no dia 5 deste mês em Petrópolis, região serrana do Rio de Janeiro.

Com ele foram presas outras 10 pessoas, suspeita de envolvimento na seita religiosa, que estaria envolvida em estelionatos, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro. Quatro mulheres e sete homens foram encontrados no bairro Itaguaí, no Rio de Janeiro. Eles foram encaminhados para a 105ª Delegacia de Polícia, no bairro Retiro.

Mesmo com a prisão do líder na década de 1990, a Seita Mundial nunca deixou de funcionar. Seus participantes se mantiveram em atividade e mais tarde se mudaram para Petrópolis, onde forma descobertos em 2013

Em abril do ano passado, a polícia descobriu um sítio localizado no km-74, na rodovia BR-040. Na ocasião, foi cumprido um mandado de busca e apreensão e encontrados documentos e roupas de crianças enterrados no terreno, além de livros de procedimentos cirúrgicos, grande quantidade de ácido glicólico, diversos cartões de crédito, documentos de pessoas jurídicas de fachada e carros de luxo. Não há, segundo a Civil, informação de que os atos de mutilação eram praticados em Petrópolis.

Na ocasião, Donato Brandão chegou a ser preso, investigado pela Polícia Civil carioca por crime de falsidade ideológica. Suspeito, também, de ter participado do sequestro de um dos membros da sua seita, de nome não revelado, ocorrido no dia 3 de abril.

Preso, ele disse à polícia que é proprietário de uma empresa de transportes públicos no estado de São Paulo e residia há três anos em um sítio, localizado às margens da BR­-040, em Petrópolis, em companhia de mais 11 jovens do estado do Maranhão, que se auto­denominam como filhos do criminoso.

Correlata

Seita Mundial no Maranhão

Em 1994, em São Luis (Maranhão), Donato Brandão era o líder da seita chamada “Moderna Unidade Normativa de Desenvolvimento Intelectual da América Latina” (Mundial). O objetivo era o “fomento de desenvolvimento intelectual” e chegou a ter seguidores em outros estados. No entanto, a seita exigia obediência irrestrita e impunha rituais de purificação violentos, como jejuns superiores a sete dias, espancamentos e violência sexual.

A polícia ficou sabendo da existência da seita após três jovens terem a sua genitália mutilada. Eles acreditavam que seria uma purificação e se transformariam em anjos para servir ao “Pai”. Achavam que precisavam da purificação porque haviam quebrado o juramento de não fazer sexo com mulheres. Esse “Pai” tratava-­se de Donato Brandão que, segundo alguns jovens que moravam na casa, mantinha práticas homossexuais com rapazes, alegando que os purificava.

Os jovens que ocupavam a casa de Donato Brandão, no bairro Araçagi, acreditavam estar estudando teologia por correspondência ­ o que foi descoberto posteriormente tratar-­se de engodo do líder da seita ­, e tinham que vender cartões e flanelas na rua para entregar o dinheiro ao “Pai”. Caso o valor estipulado não fosse entregue diariamente, o jovem ficaria sem alimento e poderia até ser espancado. Eles entravam na seita depois de assistirem a três dias de palestras proferidas por Donato Brandão.

No último dia de reunião, Donato confidenciava a todos os presentes seu segredo: era o enviado de Deus. Os jovens, em sua maioria desempregados e com problemas familiares, ficavam maravilhados com a possibilidade de servir ao “Pai” e passavam a morar com ele, cumprindo à risca todas as regras da seita Mundial, que encobria o Brandanismo, verdadeira lei de Donato Brandão.

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