Artigo

Carne forte

Atualizada em 11/10/2022 às 12h40

A carne é fraca? É, a carne é fraquíssima. Que o digam Adão e Eva. Se não tivessem fraquejado ante seus desejos fortes, estaríamos nós agora no bem-bom do Paraíso, embalados na brisa de uma bela tarde na praia, “nos espaços serenos, sem ontem nem amanhã”. E não nesta eterna luta pela vida, tendo preocupações com as de agora. Querem ver uma coisa?

A Polícia Federal pegou com a boca na botija cerca de 20 frigoríficos industriais, num universo de mais de 5 mil, no ato de fraudar a produção em um setor, o de carne animal para consumo humano, que tem consumidores, por suposto, muito sensíveis à forma como ela é industrializada. Num piscar de olhos, o mundo inteiro estava inquieto, pois os frigoríficos brasileiros misturariam papelão com suas carnes; aproveitariam restos delas, estragados; usariam nelas conservantes cancerígenos, a fim de disfarçar sua má aparência. Importadores e governos de todos os continentes começaram a recusar o produto brasileiro. Em 48 horas, as consequências surgiram vigorosas, com suspensão das exportações e ameaça de demissões. De repente, plantéis inteiros de animais, já no ponto de abate, tiveram de ser sacrificados, com prejuízos enormes. Com base em quê, tanto estardalhaço? Em, principalmente, dois laudos técnicos num universo de 5 mil empresas. Mas nunca se ouviu falar de laudo de alguém intoxicado ou morto pela carne maldita.

Mas o setor estava, mesmo, enganando, daquela forma miserável os consumidores? O setor, não. Os vinte frigoríficos estavam. Qual o motivo, então, de confusão desse tamanho? Primeiro, tratava-se de alimentos. Lembrar isso já é explicar parte da história. Quem deseja se nutrir com alimento estragado? Segundo, não houve de parte da Polícia Federal cuidado algum em mostrar o problema como circunscrito a menos de meio por cento do total da produção. Não estará exagerando quem atribuir a origem de tal comportamento ao desejo de emulação de fração dos delegados da PF com os procuradores da Lava-Jato, na disputa pelos holofotes nacionais.

Vejo, ainda, em terceiro lugar, outro possível componente dessa história destrambelhada. É a visão de ser todo empresário desonesto, enraizada na mentalidade estatizante, antimercado e anti-iniciativa privada, presente majoritariamente na cultura brasileira. É como se a desonestidade empresarial não precisasse ser provada. Daí, o desejo, consciente ou inconsciente, de criar problemas a uma indústria com faturamento na casa dos bilhões em exportações. Se é empresário, rico em especial, pau nele. Afinal, os milhões e milhões de reais perdidos, pertenciam a trambiqueiros. Todos não o são? Mas, pergunto, e os empregos desaparecidos? No fim, qual delegado vai pagar os prejuízos? Nenhum, tenham certeza. Isso é abuso de autoridade.

Essa é postura de ressentimento. É algo, em voga atualmente no país, e semelhante, parece-me, à mentalidade das pequena e média burguesias jacobinas da Revolução Francesa, que fez passar muito pescoço pela guilhotina. Aqui e agora, generaliza-se também o comportamento de políticos desonestos, como se todos os demais o fossem também, como se faz com os empresários.

Mas a carne resiste. É forte.

Lino Raposo Moreira

PhD, membro da Academia Maranhense de Letras

E-mail: linomoreira@linomoreira.com

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