Raio X

Cidade Operária padece com abandono de obras

Maternidade com apenas pilares construídos, creche com serviços parados e quartel de polícia esquecido são alguns dos trabalhos inacabados; ruas precárias e sem drenagem completam o cenário

Jock Dean / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h41
Apenas os pilares da maternidade foram erguidos; obra deveria ter sido entregue em junho de 2016
Apenas os pilares da maternidade foram erguidos; obra deveria ter sido entregue em junho de 2016

SÃO LUÍS - A Cidade Operária é um dos bairros mais populosos de São Luís. Oriundo de um projeto de habitação popular, o bairro foi inaugurado em 1987, e por causa do seu tamanho – foram entregues 7.500 unidades residenciais – logo adquiriu proporções de cidade, justificando o nome do bairro. Atualmente, 30 anos após sua inauguração, tem problemas estruturais causados pela falta de ação do poder público. Ações que são cobradas constantemente pelos seus moradores, que reclamam da falta de respeito aos cidadãos.

Uma dessas moradoras é Cleudiane dos Santos. Grávida de sete meses, ela precisa se deslocar constantemente até o Anil, onde faz o pré-natal. Ela poderia fazer o acompanhamento da gestação no próprio bairro onde mora se a Prefeitura de São Luís tivesse cumprido o prazo de entrega da obra da Maternidade da Cidade Operária, na Avenida Este 103. “Eu acho isso um desrespeito com a população. Moro aqui ao lado de onde deveria ser a maternidade e tenho de pagar passagem, porque não temos uma maternidade perto de casa”, reclama.

Cercado por placas de zinco, o terreno onde deveria estar funcionando a maternidade tem apenas colunas inacabadas. Nem sinais de paredes, telhado e toda a estrutura necessária para atender às gestantes. Faltam também operários.

Ontem, enquanto O Estado conversava com Cleudiane dos Santos, ninguém trabalhava no local. Na placa fixada no local, a data para entrega da obra é 23 de junho de 2018. Só que, segundo a comerciante Maria de Jesus Silva Araújo, que trabalha em frente às obras, esta não era a data inicial de entrega. “A data era junho de 2016, mas no ano passado, próximo das eleições, levaram a placa e, quando trouxeram de volta, haviam alterado a data”, afirma.

[e-s001]Creche inacabada
Essa não é a única obra pública abandonada na Cidade Operária. Outra delas também interessa muito a Cleudiane dos Santos: a construção de uma creche na Avenida Leste 103. Orçada em mais de R$ 1,5 milhão, a creche teve sua construção iniciada em abril de 2016 e será entregue em abril deste ano, conforme diz a placa em frente ao canteiro. “Essas datas estão erradas. A construção desta creche vem desde o começo do primeiro mandato do prefeito e nunca foi entregue”, garante Eliane Gouveia, que passava pelo local quando O Estado chegou ao terreno.

E ela não está errada. A obra faz parte de um pacote de 25 creches anunciados em janeiro de 2013, pelo prefeito Edivaldo Holanda Júnior (PDT). A chamada Agenda Estratégica dos 120 Dias previa ações em áreas como saúde, educação, trânsito e transportes. A obra foi mais uma das não concluídas na primeira gestão e, assim como a da maternidade, está abandonada. Atualmente, o prédio está com as paredes erguidas, mas o telhado e acabamentos nunca foram concluídos. No entorno do canteiro de obras, o lixo se acumula.

[e-s001]Outra obra abandonada é a de reforma e ampliação do 6º Batalhão de Polícia Militar (BPM), na Avenida Oeste, da Cidade Operária. A obra também foi iniciada há anos, mas nunca concluída.

O terreno hoje está cercado por tapumes, mas por causa das chuvas de 2016 parte deles caiu, e são pelos buracos que pessoas acessam o local. Por esses buracos nos tapumes, é possível também ver roupas estendidas no que seriam as janelas dos prédios, indicando que a obra é usada como moradia.

Ruas precárias
Além das obras públicas abandonadas, ontem, enquanto circulava pelo bairro, O Estado encontrou três homens tentando desentupir uma galeria em meio a uma forte enxurrada causada pelas chuvas. Além da correnteza forte, eles tinham que lidar com o tráfego intenso de veículos, entre os quais ônibus. “Moro aqui há 26 anos e sempre vi esta avenida alagar. Tem dias em que a água invade as casas. É uma vergonha”, diz indignado Luís Gomes.

[e-s001]A via em questão é a Avenida Este 203, uma das que contornam as obras da maternidade, que fica entre as avenidas Este 103 e Este 203. “Imagina se essa maternidade for inaugurada sem obras de drenagem? As crianças vão nascer e voltar para casa de barquinho, porque vai alagar todo o hospital, do mesmo jeito que alaga nossas casas”, diz Maria de Jesus Silva Araújo.

As vias paralelas às duas avenidas também ficam alagadas com as fortes chuvas e algumas delas têm graves problemas de pavimentação. É o caso da Rua 201 e da Rua Projetada. Ambas não têm cobertura asfáltica.

No ano passado, a Prefeitura fez a terraplanagem dos locais para que o asfalto fosse colocado, o que não aconteceu. Resultado: as fortes chuvas deste ano esburacaram as vias. “Aqui, carro só passa se o motorista for muito corajoso, porque a gente mesmo só pisa na rua porque precisa sair de casa”, conta Antônio Pedro Costa Serra.

A indignação de Euclides Ramos, que há 22 anos mora na Rua 201, talvez resuma o sentimento de toda a comunidade da Cidade Operária. “Como é que um prefeito pode se dizer prefeito de uma capital quando deixa um dos seus principais bairros chegar a estas condições?”, pergunta.

Explicações
O Estado
entrou em contato com a Prefeitura de São Luís e o Governo do Estado para saber por que as obras não foram concluídas e se existe um planejamento de ações para o bairro. A Prefeitura de São Luís, por meio da Secretaria de Obras e Serviços Públicos (Semosp), informa que tem realizado um amplo programa de melhorias na infraestrutura da Cidade Operária, que inclui a requalificação asfáltica de mais de 100 ruas e avenidas do bairro, totalizando 44,5 quilômetros de asfalto novo, além da construção de uma ponte de 10 metros que vai ligar a região à MA-201, na altura da Maiobinha, em São José de Ribamar, que está em fase de finalização.

Quanto à maternidade, a Secretaria Municipal de Saúde (Semus) informa que está realizando a rescisão contratual com a empresa responsável pela obra, que alegou falta de condições para seguir com os trabalhos devido ao atraso no repasse dos recursos por parte do Governo Federal. A Semus esclarece que, após esta etapa, a obra passará por nova licitação e será dada continuidade aos serviços.

Já a Secretaria Municipal de Educação (Semed) comunica que obras são condicionadas ao repasse de recursos do Governo Federal e que estão acontecendo. Sobre a reforma do 6º BPM, o Governo do Estado, por meio da Secretaria da Infraestrutura (Sinfra), informa que foi realizado novo processo licitatório e que as obras devem ser reiniciadas em 40 dias. Sobre a segurança, a Secretaria de Estado de Segurança Pública (SSP-MA) informa que mantém um grupamento policial cobrindo a região permanentemente. Equipes do 6° BPM realizam, diariamente, rondas e abordagens a pessoas e veículos na localidade.

Números
R$ 1.695.479,48
é o valor da construção da creche
R$ 24.807.123,41 é o valor da construção da maternidade

SAIBA MAIS

A Cidade Operária foi o maior conjunto de habitação destinada à classe operária entregue pela antiga Companhia de Habitação Popular (Cohab), órgão criado durante a Ditadura Militar (1964-1985) cujo objetivo era a construção de habitação popular de massa em diversos estados brasileiros. Eram 7.500 casas que faziam jus ao nome de cidade dado ao bairro, que hoje conta com ampla rede de supermercados, hospitais, escolas públicas e privadas, bancos, além de ser servida por várias linhas de ônibus, um terminal de transportes e onde está localizada a Universidade Estadual do Maranhão (Uema). A primeira etapa das obras foram concluídas em 1986 e entregues aos moradores em 1987. Entretanto, nem todos os imóveis construídos foram entregues, o que motivou muitas invasões das unidades habitacionais e do entorno do bairro.

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