Despedida

Corpo de Ferreira Gullar é sepultado no mausoléu da Academia Brasileira de Letras

Maranhense radicado no Rio de Janeiro morreu no domingo (5), aos 86 anos, em decorrência de uma pneumonia

Atualizada em 11/10/2022 às 12h43
Corpo de Gullar foi enterrado no Rio
Corpo de Gullar foi enterrado no Rio

RIO DE JANEIRO - O corpo do poeta Ferreira Gullar foi sepultado na tarde desta segunda-feira, 5, no mausoléu da Academia Brasileira de Letras (ABL), no Cemitério São João Batista, na zona sul do Rio. O túmulo fica ao lado da sepultura do poeta Ivan Junqueira, a quem Gullar sucedeu na ABL quando da sua morte, em 2014, e abaixo da do poeta João Cabral de Melo Neto. Amigos e parentes cantaram "O trenzinho do capirinha", letra de Gullar para a música de Heitor Villa-Lobos, e aplaudiram quando o caixão baixou a sepultura.

O amigo e curador de arte Leonel Kaz fez um discurso emocionado em que ressaltou a "temperança" e "honestidade absoluta" de Gullar. "Ele dizia que a vida é uma invenção e ele talvez tenha sido uma grande invenção de si mesmo, uma invenção comovidamente brasileira", disse Kaz, que conviveu com o poeta por 45 anos. Ele também leu o poema de Gullar "Uma pedra é uma pedra", que termina com os versos "e assim / o homem tenta / livrar-se do fim / que o atormenta / e se inventa".

História

Ferreira Gullar, cujo nome verdadeiro é José de Ribamar Ferreira, nasceu em São Luís, em 10 de setembro de 1930, numa família de classe média pobre. Com 18 anos, passou a frequentar os bares da Praça João Lisboa e o Grêmio Lítero-Recreativo, onde, aos domingos, havia leitura de poemas. Descobriu a poesia moderna apenas aos 19 anos, ao ler os poemas de Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira.

Pouco depois, aderiu a ela e adotou uma atitude totalmente oposta à que tinha anteriormente, tornando-se um poeta experimental radical. Seu primeiro livro, Um Pouco Acima do Chão, foi escrito ainda dentro do modelo parnasiano e por isso foi relegado pelo próprio poeta durante um bom tempo. Em 1954, lançou A Luta Corporal, livro que lhe lançou no cenário nacional.

O poeta é considerado o fundador do neoconcretismo, movimento surgiu em 1959, com um manifesto escrito por Gullar, seguido da teoria do não-objeto. Esses dois textos fazem hoje parte da história da arte brasileira, pelo que trouxeram de original e revolucionário.

Gullar é considerado o fundador do neoconcretismo
Gullar é considerado o fundador do neoconcretismo

Mantendo-se experimental, criou o Livro-Poema e, depois, o Poema Espacial, e, finalmente, o Poema Enterrado. Este consiste em uma sala no subsolo a que se tem acesso por uma escada; após penetrar no poema, deparam-se com um cubo vermelho; ao ser levantado este cubo, encontra-se outro, verde, e sob este ainda outro, branco, que tem escrito numa das faces a palavra “rejuvenesça”.

O poema enterrado foi a última obra neoconcreta de Gullar, que afastou-se do grupo e integrou-se na luta política revolucionária. Entrou para o Partido Comunista e passou a escrever poemas sobre política e participar da luta contra a ditadura militar que havia se implantado no país, em 1964. Foi processado e preso na Vila Militar. Mais tarde, teve de abandonar a vida legal, passar à clandestinidade e, depois, ao exílio. Deixou clandestinamente o país e foi para Moscou, na Rússia, depois para Santiago do Chile, Lima, no Peru, e Buenos Aires, Argentina.

Voltou para o Brasil em 1977, quando foi preso e torturado. Libertado por pressão internacional, voltou a trabalhar na imprensa do Rio de Janeiro e, depois, como roteirista de televisão.

Teatro
Durante o exílio em Buenos Aires, Gullar escreveu Poema Sujo, um longo poema de quase cem páginas e que é considerado sua obra-prima. Esse poema causou enorme impacto ao ser editado no Brasil e foi um dos fatores que determinaram a volta do poeta a seu país. Poema Sujo foi traduzido e publicado em várias línguas e países.

De volta ao Brasil, Gullar publicou, em 1980, Na vertigem do dia e Toda Poesia, livro que reuniu toda sua produção poética até então. Voltou a escrever sobre arte na imprensa do Rio de Janeiro e São Paulo, publicando, nesse campo, dois livros Etapas da arte contemporânea (1985) e Argumentação contra a morte da arte (1993), onde discute a crise da arte contemporânea.

Outro campo de atuação de Ferreira Gullar é o teatro. Após o golpe militar, ele e um grupo de jovens dramaturgos e atores fundou o Teatro Opinião, que teve importante papel na resistência democrática ao regime autoritário. Nesse período, escreveu, com Oduvaldo Vianna Filho, as peças Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come e A saída? Onde fica a saída? De volta do exílio, escreveu a peça Um rubi no umbigo, montada pelo Teatro Casa Grande em 1978.

Gullar afirmava que a poesia era sua atividade fundamental. Em 1987, publicou Barulhos e, em 1999, Muitas Vozes, que recebeu os principais prêmios de literatura daquele ano. Em 2002, foi indicado para o Prêmio Nobel de Literatura. Em 2010, foi o vencedor do Prêmio Camões, a maior homenagem da literatura de língua portuguesa.

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