Comentário

O livro que forma cidadãos

Boas opções de presente para o Dia das Crianças (12 de outubro), as obras infantis são brinquedos que, além de entreter e divertir, contribuem na construção de leitores críticos e livres diante do mundo

Rosa Maria Ferreira Lima *

Atualizada em 11/10/2022 às 12h44
Detalhe de página  do premiado livro “Girafas não  sabem dançar”
Detalhe de página do premiado livro “Girafas não sabem dançar” (livro infantil)

A leitura do mundo, com olhar crítico e visão abrangente da realidade, é necessária ao ser humano. Inclua-se nesse rol leituras sobre todas as áreas do conhecimento e linguagens artísticas, porque um cidadão precisa conhecer para exercer sua cidadania e um profissional deve dominar o arcabouço de sua área para exercer bem sua função. E todos devem ter a leitura como instrumento principal, em especial bibliotecários, professores e educadores em geral.

Para ter essa habilidade é necessário que o sujeito leia com a emoção, com o intelecto e com os sentidos, compreendendo a importância e a função social e política que a leitura exerce na sua vida. Mas, para chegar a esse estágio é fundamental que a população tenha acesso aos bens culturais, especialmente ao livro e à leitura, que é um direito de todos, desde a primeira infância. E esse acesso deve ser frequente, variado e de qualidade.

Para isso, existem dois caminhos a serem percorridos, como dois fios que se entrelaçam: o acesso e o incentivo. O primeiro, a ser alcançado com a disponibilidade de uma rede de bibliotecas públicas, escolares, comunitárias e rurais, que tenham espaço adequado, acervo de qualidade e pessoal qualificado; já o segundo, a ser estimulado por pais, professores e educadores, que gostem de ler e escrever. É preciso ter a prática da leitura para promover as condições de transformar crianças, jovens, estudantes em leitores habituais.

Por outro lado, a escola brasileira ainda não valoriza a biblioteca como a unidade mais importante do projeto pedagógico de um estabelecimento de ensino. No tocante ao nosso Maranhão, especialmente em São Luís, capital conhecida como Atenas Brasileira, essa realidade atual está bem distante da ideal, apesar de algumas iniciativas estimuladoras do passado. Em 1982, foi criada a primeira biblioteca municipal de São Luís, instalada no Bairro de Fátima, com condições limitadas para atender a população e que, após alguns anos, foi abandonada e desativada pelos governantes, voltando a funcionar tempos depois em um Farol da Educação, construído pelo governo do Estado, onde permanece até os dias de hoje.

Após esse episódio raro e ao longo dos últimos 34 anos, o poder municipal não mais investiu em bibliotecas públicas. Em países desenvolvidos, o investimento em unidades de cultura dessa natureza e a valorização da leitura têm sido objetos de estratégia política para favorecer seus cidadãos. É a garantia do aprimoramento da sociedade. No Brasil, em especial no Maranhão, no entanto, o que se observa é uma preocupação apenas em instalar salas de informática com a visão equivocada de modernização e democratização do acesso à informação. É preciso entender que a transformação do sujeito não se dá como mágica, somente com instalação de rede de computadores capazes de serem acionados por botões e programas que facilitam o acesso à informação - até porque nem todos podem utilizar-se dessa tecnologia.

E mais ainda: para ser usuário desse sistema e de outras novas tecnologias, mais do que conhecer os programas, é fundamental conhecer suas próprias necessidades, ter ideia do espaço que ocupa na sociedade, da dimensão de sua atuação e da qualidade do sujeito que é. E nesse sentido a solução é ler, ser leitor, não só de livros, mas leitor de imagens, de política, de administração pública. Um leitor que possa acompanhar com o olhar crítico as discussões sobre os caminhos que a sociedade deve tomar, para alcançar o equilíbrio entre produção, lazer, bem-estar e criatividade.

Vale ressaltar que, ao contrário do que se tenta apregoar, a comunicação nesses tempos de internet veio enriquecer o universo das palavras e do pensamento. É construída com base na sociedade letrada, seja pela imagem ou pela escrita que está nos textos como apoio às imagens e às falas.

Assim, o que se deve ter em mente é que as comunicações eletrônicas e/ou visuais estão apoiadas em textos escritos. São os esquemas, roteiros, planejamento, textos científicos, informativos e literários.

Nesse contexto, a formação de leitores, voltados aos textos de literatura – arte de usar as palavras para expressar as ideias - é uma porta de comunicação com o mundo, especialmente a literatura infantil e juvenil que aborda as mesmas temáticas das obras para adultos, e que seduz leitores de todas as idades, pela estética da linguagem, originalidade das narrativas, além das ilustrações e projetos gráficos e editoriais criativos e bem elaborados.

Que fique claro e publique-se: a literatura infantil e juvenil é um passaporte fundamental no processo de formação de leitores, cujo percurso se inicia com o pré-leitor até chegar ao leitor crítico.
Monteiro Lobato, criador da literatura infantil e juvenil no Brasil, cansado de escrever para adultos apostou na infância quando lançou, em 1931, “A menina do narizinho arrebitado”, o primeiro livro de literatura infantil brasileiro, depois publicado com o título “Reinações de Narizinho”. É um livro para a escola, com tensão artística, sem as velhas e desgastadas formas moralistas e conservadoras.

Para ressaltar a importância da literatura infantil na qualidade da educação, Lobato afirma: “Através de uma boa história, o aluno aprende português, matemática, geográfica, física e outras matérias, sem ter cara de aula, senão vira didática, que é outro departamento não tão comprometido com mudanças como a literatura”. Já o poeta Bartolomeu Campos Queirós declara “que as palavras sabem muito mais longe” para enfatizar a magia da leitura. Portanto, não se tem dúvidas de que através de uma aventura, o leitor percorre não só os caminhos da literatura, como também da plástica, da música, teatro e outras linguagens artísticas e termina descobrindo o livro como uma caixa mágica de surpresas.

E para confirmar, Ziraldo afirma: “Ler é mais importante do que estudar, porque quem tem a prática da leitura conduz o estudo com mais facilidade”.

E o brasileiro não tem do que reclamar quanto à oferta. Temos à disposição uma vasta e rica produção editorial no campo literário, que se destaca nas bienais, onde 70% são destinados a crianças e jovens. Com esse cardápio amplo, o livro é o melhor presente para ofertar às crianças neste mês de outubro. É também o melhor brinquedo, que proporciona a todos uma gostosa brincadeira rumo a melhores dias, pois como diz a premiada escritora Lygia Bojunga: “Quem lê, se salva”.

* Bibliotecária, especialista em leitura e formação de leitores, coordenadora do Proler no Maranhão e votante da premiação anual da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ)

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