Artigo

Dodô e as eleições

Atualizada em 11/10/2022 às 12h45

Já estou com saudades destes dias felizes da propaganda eleitoral em que vislumbro uma cidade de sonhos que, de tão perfeita, deu vontade de me mudar para lá. Sim porque a cidade prometida, como a bíblica Canaã, que “jorrava leite e mel”, certamente não é onde moro. Mas não é bom desconfiar de véspera, o candidato eleito - às horas que escrevo, ainda não sei qual é - cumprirá todas as promessas feitas aos ilhéus.

Eleições trazem à baila a amiga Dodô (Doralina Gonçalves, quando aqui morava). Muitos querem saber notícias da trêfega maranhense casada com o boa-praça Olaf, um milionário sueco. Dodô acredita fielmente no matrimônio, tanto que casou oito vezes.

Encontrei a minha amiga em ligeira viagem que fiz ao interior de São Paulo. Foi em Campinas, na eleição passada, ela fazia compras, acompanhada de um sujeito barbudo, chinelão de dedo, camiseta, tipo intelectual alternativo anos 60, um tanto diferente das amizades de Dodô. Dadas as beijocas de costume, ela me solta a grande novidade: era candidata a prefeita em uma cidadezinha do interior de Minas. Ué, desde quando te interessas por política? Ah, foi o Miguel que descobriu o meu carisma político e me fez ver as minhas qualidades de liderança.

E me apresenta o cujo: Miguel, meu amigo e intelectual. Dodô andando com intelectuais? Então mudou. Ela não é propriamente a “loura burra”, embora esteja louríssima e seu interesse por leitura não vá além de revistas sobre a alta sociedade. Prazer, digo, o senhor é professor, qual a sua área, tem obras publicadas? Ah não, amiga, Miguel é jornalista, faz resenhas de livros para jornal. Penso comigo, leitor de orelhas de livros, um pouco acima do cara que faz a seção de horóscopos, ou não.

Corroborando sua cultura de almanaque, Miguel joga em cima de mim um monte de autores, traduções e editoras e eu me mostro devidamente impressionada - não posso decepcionar a minha amiga. Aliás, nem adianta levantar suspeitas sobre o seu novo guru. Dodô não aceitaria. Além do mais, Miguel defende as minorias, sejam elas quais forem e acredita na vitória de Dodô. Reforça o ponto forte da plataforma da candidata, criação de marketing dele próprio: todos os habitantes abaixo da linha de pobreza de Ipê Amarelinho terão direito a um aparelho sanitário em seus casebres. Esqueci-me de dizer que uma das indústrias de Olaf, o maridão, é de louças sanitárias. O levantamento feito por Miguel chega a 180 mil “residências” a serem atendidas, aquelas em que os moradores vão à casinha, no fundo do quintal ou detrás da moita mesmo.

Tento objetar, Mas Dodô, e o encanamento, fossa, água corrente, esses detalhes insignificantes? Ah, amiga, isso não é comigo. Dou o vaso e pronto. O incentivo à higiene está feito. Sinto comunicar que a minha amiga não ganhou a eleição, que foi decidida no primeiro turno com a vitória do outro candidato que prometia televisões e cursos de corte e costura gratuitos. Também não sei lhes informar que fim levou o intelectual Miguel após seu insucesso como marqueteiro. Deve ter saído com alguns contos a mais. Dodô é rica e generosa. No entanto, posso lhes garantir, firmada no conhecimento de longos anos, que Dodô realmente possui em carisma tanto quanto lhe falta em tino político.

Fico imaginando o que fariam os favelados de Ipê Amarelinho com tantos vasos sanitários doados. Quem sabe serviriam para outros usos: com um pequeno tampo, uma mesa; dispensa para alimentos de cesta básica doada ou um gracioso canteiro de horta. É, não seria de todo inútil.

Ceres Costa Fernandes

Mestra em Literatura e membro da Academia Maranhense de Letras

E-mail: ceresfernandes@superig.com.br

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