Perda

O Maranhão perde o escritor Jomar Moares

Pesquisador, ensaísta, cronista, crítico e historiador da literatura maranhense, o grande personagem da história deixou um legado como poucos; ele ocupava a cadeira nº 10 da AML

Atualizada em 11/10/2022 às 12h46
Jomar Moraes amava os livros, tanto que escreveu muitos deles; ele passou 23 anos como presidente
Jomar Moraes amava os livros, tanto que escreveu muitos deles; ele passou 23 anos como presidente (Jomar)

SÃO LUÍS - O pesquisador, ensaísta, cronista, crítico e historiador da literatura maranhense, Jomar Moraes, faleceu na manhã de ontem, deixando um grande legado para a cultura maranhense. Jomar Moares tinha 76 anos e tinha problemas renais. Ele deu entrada no Hospital São Domingos na noite de sábado, dia 13. De acordo com a família, ele teve um mal estar com queda de pressão e chegou a passar pelo procedimento de colocação de marca-passo provisório, mas não resistiu e faleceu por volta das 6h30 de ontem. A cerimônia de sepultamento acontece às 10h de hoje, no Cemitério Jardim da Paz.

Jomar Moraes tinha problemas renais e fazia hemodiálise duas vezes por semana, mas seu falecimento foi inesperado. No sábado, dia 13, ele estava em casa fazendo o que mais gostava: escrever. Mas o escritor teve uma queda de pressão e foi levado para o Hospital São Domingos onde faleceu no início da manhã de ontem, deixando esposa, seis filhos e dois netos.

O velório de Jomar Moraes começou por volta do meio dia de ontem, na sede da Academia Maranhense de Letras (AML), na Rua da Paz, centro de São Luís, onde companheiros da AML, amigos e admiradores estiveram para prestar suas homenagens ao escritor e solidariedade à família. Aliás, o velório não poderia ter ocorrido em outro local, visto que Jomar Moraes dedicou sua vida às letras maranhenses.

A família do escritor se reservou ao silêncio da dor diante da perda do pai. Por meio de seu perfil em uma rede social, Jeisa Moraes, uma de suas irmãs – eles eram sete -, lamentou o falecimento de Jomar Moraes. “Hoje, estamos sem rumo, acabamos de perder nosso irmão Jomar Moraes, esteio de nossa família e marco cultural de nossa cidade. Infelizmente, como já era sabido por todos que lhe conhecia, ele nunca se deu bem com as máquinas (tecnologia). Desde o momento que começou a fazer hemodiálise, a vida se tornou muito difícil para ele. Clamamos a Deus por ele”, escreveu.

Em sua casa Jomar Moraes mantinha uma biblioteca que, segundo Carolina Moraes Estrela, sobrinha do escritor, era sua verdadeira moradia. “A grande paixão dele era escrever, eram os livros, era a cultura maranhense, sobre a qual ele escrevia. Na verdade, ele morava mesmo era na biblioteca da casa. Era onde ele passava a maior parte do seu tempo”, disse.

Seus confrades também lamentaram a perda que seu falecimento representa para a cultura do Maranhão. “Jomar foi uma figura muito importante para o Maranhão. Ninguém é insubstituível, é fato, mas será muito difícil alguém como o mesmo nível de importância de Jomar tanto para a Academia quanto para as letras, história e pesquisa no Maranhão”, disse Benedito Buzar, presidente da AML.

O acadêmico José Ewerton Neto disse que Jomar Moraes era uma verdadeira biblioteca ambulante tamanho era o seu conhecimento. “Ele é da estirpe de intelectuais que infelizmente o Maranhão tem perdido. Só mesmo a cultura maranhense para ter noção do que representa essa perda porque as pessoas, de um modo geral, ainda vão levar um tempo para reconhecer isto. A contribuição que ele deu para a cultura maranhense é invejável, ainda mais a junção que ele tinha de paixão e dedicação à Academia de Letras”, disse.

Aos prantos, Laura Amélia Damous disse que perdeu um grande amigo. “Hoje, eu perdi um grande amigo, a Academia perdeu um dos seus grandes e o Maranhão e a sua cultura perderam também. Todos nós perdemos. Essa manhã é uma manhã de perda. Não tenho palavras para dizer o que isto representa. Mas ele ficará em nossa memória por meio dos livros que escreveu”.

O acervo bibliográfico que Jomar Moraes mantinha em casa tinha mais de 40 mil obras reunidas ao longo de todos os anos de estudos e pesquisas. No ano passado, o imortal, doou toda a sua coleção para a biblioteca central da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Imortal foi responsável por resgatar autores maranhenses

Ao longo de toda sua vida, Jomar Moraes lançou inúmeros livros de sua autoria. A última delas foi o livro “Pretexto para pré-textos”, uma coletânea de 13 ensaios lançada em 2015. Mas para o presidente da Academia Maranhense de Letras (AML), Benedito Buzar, Jomar Moraes destacou-se também por ter resgatado a obra de inúmeros autores maranhenses que estavam esquecidos e pela sua dedicação à AML.

Jomar Moares foi eleito membro da AML em 10 de maio de 1969 e ocupava a cadeira nº 10, cujo patrono foi o médico, jornalista e escritor maranhense da cidade de Cantanhede, Antonio Henriques Leal. Sua posse aconteceu em 6 de agosto do mesmo ano. Em seu discurso de posse Jomar Moraes disse receber com humildade o simbolismo da imortalidade acadêmica.

“Recebo o simbolismo da imortalidade acadêmica, bem certo de que ele me foi conferido mais como estímulo, que por merecimento, representando avultado crédito de confiança a que desejo corresponder. E creio em Deus que, se a mim não me faltarem vida e saúde, assim como da falta de talento e capacidade de trabalho injusto seria lamentar­-me, haverei de saldar esse débito - formidável débito contraído - sem nenhum vexame ou incômodo aos bondosos avalistas”, disse à época.

Jomar Moraes foi presidente da AML de 2 de fevereiro de 1984 a 2 de fevereiro de 2006. “Na Academia, ele passou 23 anos presidente, sempre muito dedicado. Sua vida se confundia com a Academia Maranhense de Letras. Ele dizia às vezes que, se pudesse, compraria uma casa próxima à Academia para ficar olhando por ela”, afirmou Benedito Buzar, presidente da AML.

Benedito Buzar destacou ainda que Jomar Moraes tinha um conhecimento sobre o Maranhão que poucas pessoas tinham. “Isso era facilitado pela privilegiada memória que ele tinha e por causa da sua afinidade com a identidade cultural do Maranhão. Por causa desse conhecimento e afinidade ele dirigiu três órgãos importantes e que precisavam de alguém com o seu perfil. Ele foi diretor do Departamento de Assuntos Culturais da UFMA e Secretário de Estado da Cultura.

Ainda de acordo com Buzar, foi Jomar Moraes quem iniciou o trabalho de resgate da memória maranhense. “Quando presidente do Sioge, ele resgatou diversos livros importantes de autores maranhenses que estavam esgotados ou eram totalmente desconhecidos. Ele buscou estas publicações, as reeditou e colocou luzes sobre elas. Também criou concursos literários tanto no Sioge quanto na Academia”, lembrou.

Jomar Moraes deixou legado na imprensa maranhense

Ao longo de sua vida, Jomar Moares manteve assídua colaboração na imprensa de São Luís, publicando diversas crônicas em O Estado. O último texto dele foi publicado na edição do dia 10 deste mês, em homenagem aos 108 anos de fundação da Academia Maranhense de Letras (AML). De certa forma a morte do escritor foi considerada inesperada por muito, sobretudo porque apesar dos 76 anos e da saúde fragilizada ele continuava ativo na produção literária e às vésperas de falecer escrevia mais uma crônica, que deixou inacabada.

A crônica inacabada que Jomar Moraes estava escrevendo seria publicada na edição do próximo fim de semana de O Estado. Uma de suas filhas, Júlia Esmeralda Moares, postou uma foto em seu perfil em uma rede social onde se vê as folhas escritas em máquina de escrever já que Jomar Moraes e as novas tecnologias não se entendiam muito bem. A crônica entitulada “Paixão Barriqueira”, falava da relação dele com o Boizinho Barrica, de quem era padrinho. No primeiro parágrafo do texto pode-se ler o seguinte: “Se um dia acaso me perguntassem acerca de quand’onde provém essa ardente e declarada paixão que o passar do tempo somente há feito aumentar, prontamente responderia eu que de tempos tão antanhos antecedem o encontro com o dito cujo”.

A editora do caderno Alternativo, onde foi publicado o último texto escrito pelo escritor falou da relação dele com O Estado. “Ele foi colaborador do jornal desde os anos 1970, teve a coluna ‘Hoje é dia de...’, no Alternativo. Ele contribuiu ainda com outras referências, ajudando em pesquisas. Sempre foi uma fonte de O Estado”, destaca Bruna Castelo Branco, editora do caderno Alternativo.

A jornalista destacou ainda que Jomar Moraes era um dos principais pesquisadores do Maranhão e lembrou-se da última conversa que teve com ele. “Falei com o Jomar na quarta-feira, dia 10. Ele ligou para avisar que estava terminando um texto sobre o Boizinho Barrica e iria me enviar para a próxima semana. Rimos bastante de alguns causos que já tínhamos conversado e ele ficou de me contar outras coisas, sempre gentil e amigo como sempre”, disse.

O diretor de O Estado, Clóvis Cabalau, destacou a importância do escritor. “Jomar era um militante da literatura. Tinha palavras correndo nas veias. Escritor apaixonado, missão que cumpriu com a gana dos abnegados. Na Academia e nas páginas de O Estado, deixou a marca do amor ao ofício que o escolheu”.

Biografia

Jomar da Silva Moraes nasceu em Guimarães, cidade a 70 quilômetros de São Luís, em 6 de maio de 1940. Filho de José Alipio de Moraes Filho e Marcolina Cyriaca da Silva foi pesquisador, ensaísta, cronista, crítico e historiador da literatura maranhense, além de editor de textos.

Formou-se Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) em 24 de julho de 1976. Era especialista em Direito Empresarial e em Comunicação Social, nas áreas de Rádio e TV, Publicidade e Propaganda. Foi também mestre em História, com área de concentração em História do Brasil. No dia 24 de setembro de 2015, ele recebeu, na Academia Maranhense de Letras, o título de Doutor Honoris Causa.

Sua primeira função foi soldado da Polícia Militar do Maranhão (PMMA), onde permaneceu de 1959 a 1967, chegando, por cursos, à graduação de 3° sargento. Foi diretor do Serviço de Administração da Secretaria de Educação e Cultura (1970 a 1971), diretor da Biblioteca Pública do Estado (1971 a 1973), diretor do Departamento de Assuntos Culturais da Fundação Cultural do Maranhão (1973 a 1975), diretor do Serviço de Imprensa e Obras Gráficas do Estado (Sioge) (1975 1980), diretor do Departamento de Assuntos Culturais da Universidade Federal do Maranhão (1981 a 1985) e secretário de Estado da Cultura do Estado do Maranhão (1985 a1987).

Pertenceu, em dois mandatos consecutivos, ao Conselho de Administração do Instituto de Previdência do Estado do Maranhão (IPEM) e ao Conselho Estadual de Cultura, que posteriormente presidiu, na condição de secretário da Cultura. Representou a Academia Maranhense de Letras (AML) no Conselho Universitário da UFMA em cinco mandatos de dois anos cada. Integrou, de 1987 a 1988, a Comissão Nacional do Centenário da Abolição e a Comissão Nacional do Guia Brasileiro de Fontes para a História da África, da Escravidão Negra e do Negro na Sociedade Atual.

Entre as diversas funções que desempenhou, foi ainda auditor fiscal do Estado do Maranhão, advogado da UFMA, desde setembro de 1984 e, a partir de 1990, procurador federal com exercício na UFMA, da qual foi procurador-chefe no período de novembro de 1996 a agosto de 2006. Foi ainda estagiário da Escola Superior de Guerra (Rio de Janeiro, 1980), membro correspondente dos Institutos Históricos e Geográficos do Piauí e do Distrito Federal, da Academia Paraibana de Letras e da Academia Paranaense de Letras.

Ao longo de sua vida, Jomar Moares recebeu inúmeras homenagens. Nascido em Guimarães, recebeu o título de Cidadão honorário de São Luís, de Buriti Bravo e de Alcântara. Recebeu também as medalhas: Santos Dumont, do Ministério da Aeronáutica; Brigadeiro Falcão, da Polícia Militar do Maranhão; João Lisboa, do Conselho Estadual de Cultura do Maranhão; do Sesquicentenário da Adesão do Maranhão à Independência; do Mérito Timbira; da Ordem dos Timbiras (grande oficial); de comendador do 4º Centenário de São Luís, do Governo do Maranhão; comendador da Ordem de Rio Branco (Brasil) e da Ordem Nacional do Mérito de Portugal; Medalha Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras; Padre Antônio Vieira, da União Brasileira de Escritores (UBE), sediada no Rio de Janeiro, e Simão Estácio da Silveira, da Câmara Municipal de São Luís.

Foi agraciado ainda com a medalha do 4º Centenário de São Luís, outorgada pela Assembleia Legislativa do Estado e, com as Palmas Universitárias, conferidas pela Universidade Federal do Maranhão. Ao longo da sua vida foi também distinguido com 11 prêmios literários e com os diplomas de Personalidade Cultural (1980) e de Mérito Cultural (1981, 1988, 2000 e 2005) da UBE-RJ.

NOTAS DE PESAR

Universidade Federal do Maranhão - UFMA

É com pesar que a Universidade Federal do Maranhão comunica o falecimento do escritor, historiador e ex-procurador da UFMA, Jomar da Silva Moraes, falecido neste domingo, 14, às 06h30, aos 76 anos. Ele teve um mal estar com queda de pressão e chegou a passar pelo procedimento de colocação de marca-passo provisório e não resistiu. O velório será na Academia Maranhense de Letras, mas ainda não foi informado o horário e nem local do sepultamento.

Governo do Estado

O Governo do Maranhão lamenta o falecimento do escritor, pesquisador e professor Jomar Moraes. Natural do município de Guimarães, Jomar tinha 76 anos e estava internado no Hospital São Domingos, com problemas de pressão, desde o último sábado.

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Maranhão, Jomar Moraes atuava ainda como ensaísta, cronista, crítico e historiador. Começou a carreira profissional como soldado da Polícia Militar do Maranhão (PM-MA) e chegou a ser diretor da Biblioteca Pública Benedito Leite e Secretário de Estado da Cultura do Maranhão.

O velório será realizado na Academia Maranhense de Letras (AML), onde ocupava a cadeira de número 10. Neste momento de dor, o Governo do Maranhão se solidariza com os familiares, amigos e admiradores de Jomar Moraes.

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