Maria da Penha

Desde a criação da Lei Maria da Penha, Vara da Mulher recebeu 17 mil processos

Com a lei em vigor, 800 homens foram condenados pela Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de São Luís

Jock Dean / O Estado

Atualizada em 11/10/2022 às 12h46

SÃO LUÍS - Completando 10 anos em vigor neste fim de semana, a Lei Maria da Penha (11.340/06) é considerada uma das mais avançadas do mundo, com relação à proteção da mulher, de acordo com o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem). E desde 2008 a Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de São Luís recebeu mais de 17 mil processos. Desses, 7 mil ainda estão em tramitação.

Desde que a lei entrou em vigor, 800 homens foram condenados. Desses, quem teve a maior pena foi um acusado, condenado há 10 anos e 6 meses de reclusão, juntando vários crimes previstos, conforme divulgado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão (TJ).

Neste período, também foram concedidas 11 mil medidas protetivas, como afastamento do agressor da residência, proibição de frequentar a casa da vítima ou dela se aproximar ou manter algum tipo de comunicação com a vítima, entre outras.

Os casos de homicídios de mulheres, configurados como feminicído, tramitam nas varas do tribunal do júri. Na Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, tramitam os crimes de médio potencial ofensivo, que são os contemplados pela Lei Maria da Penha.

Transformação social
Para o juiz Nelson de Moraes Rêgo, titular da Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, a Maria da Penha é um mecanismo de transformação social. “Com esta lei, o Estado criou um excelente mecanismo para que a sociedade mude um comportamento histórico de machismo, que é a submissão da mulher pelo homem, e de misoginia, que é a aversão ao feminino. Tanto que em crimes como estupro e feminicídio percebemos a clara tentativa de desconfigurar os emblemas do gênero e do corpo feminino, como a mutilação dos órgãos genitais”, afirma.

Ainda de acordo com o magistrado, a lei brasileira é a melhor que existe no mundo ocidental. “A Organização das Nações Unidas considerou a Lei Maria da Penha, a lei da Mongólia e da Espanha as três melhores do tipo no mundo. Eu não conheço a lei da Mongólia, mas já tive a oportunidade de estudar na Espanha e a lei daquele país e fiz estudos comparativos que mostram que a lei brasileira é melhor”, afirma.

Violência psicológica
Segundo os dados divulgados na sexta-feira, dia 5, pela Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, o maior número de casos de violência doméstica contra a mulher em São Luís ainda é a psicológica e grande parte dos agressores, ex-companheiros das vítimas, com as quais têm filhos. A violência psicológica como ameaças representa 34,4% dos casos. A física, como lesão corporal, representa 29% dos casos, e violência a moral, como injúria e difamação, 28%.

Ainda segundo o levantamento, a maior incidência ocorre com homens na faixa etária dos 26 e 34 anos (35,6% dos casos); solteiros (59%), seguido dos casados (21%). Os dados também mostram que 43,9% dos agressores eram ex-companheiros das vítimas, enquanto 15,2% eram companheiros e 11%, maridos.

Mas também há homens com outro vínculo de parentesco, como pai, filho, irmão, tio e cunhado (11,6%). Em 66% dos casos, a violência ocorreu dentro de casa, com uso de arma branca como facas e outros objetos (80%) e de arma de fogo (20%).

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O levantamento se baseia em 508 processos de medidas protetivas referentes ao ano de 2015, que tramitam na unidade judiciária. O inconformismo do homem com o fim do relacionamento continua aparecendo como o principal motivador para a prática da violência (31,4% dos casos). Dos pedidos de medidas protetivas apresentados nos processos, 58% vêm da Delegacia Especial da Mulher, 14% originadas na própria Vara da Mulher, 9% na Defensoria Pública, 9% no Ministério Público e os demais de outras instituições. A grande maioria das mulheres recorre à Justiça para obter medidas protetivas.

Processos em tramitação
Atualmente, a vara tem 7 mil processos em tramitação. Para o juiz Nelson de Moraes Rêgo, o sistema penal deveria modificar o regime prisional para os condenados pela Lei Maria da Penha, que é aberto.
“Esse regime deveria ser semiaberto por se tratar de crimes de médio potencial ofensivo. Este foi um ponto que passou despercebido durante a elaboração da lei e eu acredito que essa mudança daria mais efetividade no combate à violência contra a mulher, dando maior rigor no cumprimento dessa pena”, diz.

Por causa dos 10 anos da lei, o Judiciário maranhense realiza várias ações relativas à violência de gênero. De 15 a 19 de agosto, como parte das atividades da Campanha Nacional “Justiça pela Paz em Casa”, ocorre um mutirão para agilizar processos referentes à violência contra a mulher, além de audiências de ações cíveis ou de família em que esse público é parte interessada e julgamento no tribunal do júri.

Em São Luís, a Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher agendou para o período audiências de 180 processos penais e julgamento de mais 82, além de iniciar este mês um novo grupo de trabalho do Programa de Reeducação e Reabilitação do Agressor, com 13 homens que estão respondendo processo ou já foram julgados e cumprem pena. Dos 206 que já passaram pelo programa, nenhum reincidiu em casos de violência.

NÚMEROS
17.259 processos já foram recebidos pela Vara Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de São Luís

7.949 ações estão em tramitação
800 homens já foram condenados
11 mil medidas protetivas foram concedidas

O QUE DIZ A LEI MARIA DA PENHA

A lei define que a violência doméstica contra a mulher é crime e aponta formas de evitar, enfrentar e punir a agressão. A lei indica a responsabilidade que cada órgão público tem para ajudar a mulher que está sofrendo violência. Com a lei, o juiz passou a ter poderes para conceder as chamadas medidas protetivas de urgência, que servem para proteger a mulher que está sofrendo violência. A lei garante ainda a inclusão da mulher vítima de violência em programas de assistência, atendimento médico, serviços que promovam sua capacitação, geração de trabalho, emprego e renda e, caso a mulher precise se afastar do trabalho por causa da violência, ela não poderá ser demitida por um período de até seis meses.

Identificada a violência doméstica...
A Lei Maria da Penha define cinco formas de violência doméstica e familiar contra as mulheres:
- Violência psicológica
xingar e humilhar;
ameaçar, intimidar e amedrontar;
criticar continuamente, desvalorizar os atos e desconsiderar a opinião ou decisão da mulher, debochar publicamente, diminuir sua auestima;
tirar a liberdade de ação, crença e decisão;
tentar fazer a mulher ficar confusa ou achar que está ficando louca;
atormentar a mulher, não deixá-la dormir ou fazê-la se sentir culpada;
controlar tudo que ela faz, quando sai, com quem e aonde vai;
impedir que ela trabalhe, estude, saia de casa, vá à igreja ou viaje;
procurar mensagens no celular ou e-mail;
usar os filhos para fazer chantagem;
isolar a mulher de amigos e parentes
- Violência física
bater e espancar;
empurrar, atirar objetos, sacudir, bater;
morder ou puxar os cabelos;
estrangular, chutar, torcer ou apertar os braços;
queimar, cortar, furar, mutilar e torturar;
usar arma branca, como faca ou ferramentas de trabalho, ou arma de fogo
- Violência sexual
forçar relações sexuais quando a mulher não quer ou quando estiver dormindo ou doente;
forçar a prática de atos sexuais que causam desconforto ou nojo;
fazer a mulher olhar imagens pornográficas quando ela não quer;
obrigar a mulher a fazer sexo com outras pessoas;
impedir a mulher de prevenir a gravidez, forçá-la a engravidar ou ainda forçar o aborto quando ela não quiser
- Violência patrimonial
controlar, reter ou tirar dinheiro dela;
causar danos de propósito a objetos de que ela gosta;
destruir, reter objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais e outros bens direitos;
- Violência moral
fazer comentários ofensivos na frente de estranhos ou desconhecidos;
humilhar a mulher publicamente;
expor a vida íntima do casal para outras pessoas, inclusive nas redes sociais;
acusar publicamente a mulher de cometer crimes;
inventar histórias ou falar mal da mulher para os outros com o intuito de diminuí-la perante amigos e parentes

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