Editorial

Adolescentes perante a lei

Atualizada em 11/10/2022 às 12h46

O que dizer de um crime em que a vítima é uma mulher que, em um gesto solidário e esplendoroso, resolveu adotar uma criança, então com 7 anos, segundo informa uma parente em rede social, e essa mulher acaba sendo assassinada por essa filha, que, aos 14 anos de idade revolta-se contra a mãe por esta não aceitar seu namoro com um também adolescente, de 16 anos, seu cúmplice? Crueldade, selvageria, desamor, desespero e muitas outras palavras poderiam traduzir o fato, mas a principal é revolta, pois um gesto tão nobre de adoção se transformou em raiva e assassinato.

Foi exatamente isso que ocorreu com Tatiana Albuquerque Cutrim, que no dia 23 deste mês, foi morta a facadas e estrangulada, sem direito nenhum a defesa, condenada à morte por dois menores. O crime chocou São Luís pela crueldade e pela frieza da garota ao narrá-lo crime durante depoimento à polícia no qual ela contou que a rejeição do namoro foi fazendo-a criar raiva da mãe, sentimento que foi crescendo ao ponto de ela planejar a sua morte, crime que contou com a ajuda do namorado. Após o assassinato, os dois adolescentes fugiram e foram encontrados em Santa Inês, onde foram apreendidos pela polícia e trazidos para São Luís.

Como se não bastasse o choque do terrível crime, familiares e a população tiveram outra triste surpresa, quando, quatro dias depois do assassinato, no dia 27, a Justiça, em uma Audiência de Custódia, decretou como primeira “pena” a internação dos adolescentes por 45 dias em unidades de ressocialização da Fundação da Criança e do Adolescente (Funac), conforme previsto no polêmico Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

A decisão foi em cumprimento à lei, sabe-se, mas analisando-se essa própria lei, vê-se que mesmo sendo apreendidos em flagrante, por terem cometido um crime por motivo torpe e fútil, e assumido a autoria, passarão 45 dias recolhidos e depois ficarão livres até espera da instrução processual - na qual, trocando em miúdos, o Estado é que terá que provar que os jovens foram realmente os autores do assassinato - e depois o julgamento para responderem por ato infracional. E mais: segundo o ECA, a pena máxima para esse tipo de crime cometido por adolescentes é de no máximo três anos de internação em um centro de ressocialização - se maiores, a pena seria de 30 anos e cumprida em um presídio.

Esse caso suscita uma pergunta: por que um adolescente tem maturidade para planejar um crime com requintes de crueldade, mas na visão da lei não pode responder à mesma altura por esse crime? Esse tipo de situação nos dá a sensação de impunidade e, por mais que juízes, assistentes sociais, psicólogos e outros profissionais que lidam com adolescentes preguem que o ECA é mal interpretado, o que se vê na prática são adolescentes utilizando-se dessa “prerrogativa e amparo legal” para praticar os mais diversos crimes, desde simples roubos, assaltos e assassinatos. Se há má interpretação do Estatuto, porque então não se vê o que a sociedade realmente espera, que são adolescentes que cometem algum ato infracional sendo ressocializados e conscientes de que o crime não compensa? O que se vê são menores ameaçando pais de prisão quando estes tentam lhe corrigir, ainda que de forma mais enérgica, ou cidadãos sendo ameaçados nas ruas por menores alegando que nada acontece a eles.

Que o caso de Tatiana Cutrim sirva de reflexão e que o ECA cumpra realmente seu papel de proteger as crianças e adolescentes da violência, garantindo-lhes vida digna, escola, saúde e outros direitos.

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.