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Lesões: o pesadelo dos corredores de rua

Dores ao correr podem ser sinal de que algo não está bem; tênis inadequados e excesso de treinos podem prejudicar

Paula Boueri / Editora do Viva Mais

Atualizada em 11/10/2022 às 12h56
Fatores como tênis inadequado podem provocar lesões
Fatores como tênis inadequado podem provocar lesões

Imagine a situação, corredor: um dia de treino qualquer e você sente uma pequena dor. “Mas qual é o corredor que vez ou outra não sente uma dorzinha?”, você pensa. E segue com os treinos normalmente, negligenciando o aviso que o corpo deu. Um tempo depois, outro treino e a dor que persiste torna-se mais forte, a ponto de não te deixar completar o percurso. O estrago está feito, você está lesionado e, provavelmente, ficará de molho por algumas semanas ou meses.

As lesões de corrida são o pior pesadelo de qualquer corredor. Mas, assim como o número de adeptos da atividade tem crescido, proporcionalmente tem aumentado o número de pacientes nos consultórios com algum tipo de problema causado na prática esportiva

Segundo o ortopedista Fábio Rolim, da Osteo Clínica, as principais causas de lesões são calçado inadequado para a pisada e terreno, falta ou negligência com o aquecimento e alongamentos e excesso de treino. “Muita gente começa a praticar a corrida sem conhecimento do próprio corpo, não sabe a pisada que tem - se é pronada, supinada ou neutra -, tampouco da funcionalidade do aquecimento e dos alongamentos”, afirma.

O fisioterapeuta André Britto, professor mestre do curso de Medicina da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), acrescenta que, além desses fatores extrínsecos, ou seja, aqueles que direta ou indiretamente estão ligados à preparação ou prática da corrida, outros intrínsecos podem estar associados aos casos de lesão. “Elas podem ser causadas pela sobreposição de dois ou mais fatores. Além dos erros de planejamento e execução do treinamento, também existem aqueles supostamente inerentes ao organismo predisposto, como anormalidades biomecânicas e anatômicas, por
exemplo”, completa.

Entre as lesões mais comuns em corredores destacam-se a fascite plantar, tendinite de Aquiles, canelite, síndrome da banda tibial, fraturas por estresse e condromalácia (ver quadro completo). “Todas estas lesões podem ser tornar crônicas, se ignoradas e não tratadas. No caso da fratura por estresse e da lesão do menisco, há um agravante, pois podem se tornar casos cirúrgicos”, alerta o ortopedista Fábio Rolim.

"O principal erro e pecado cometido por corredores é executar treinos com volumes e intensidades inadequados ao seu condicionamento físico"Calixto Júnior, instrutor de corrida

Intensidade - Tanto o ortopedista Fábio Rolim quanto o fisioterapeuta André Britto, são unânimes ao afirmar que o excesso de treinos e falta de descanso estão diretamente associados às lesões em corredores. O que é corroborado pelo educador físico e instrutor de corrida Calixto Júnior, da Eu Corro Assessoria Esportiva.

"O principal erro e pecado cometido por corredores é executar treinos com volumes e intensidades inadequados ao seu condicionamento físico. O treino tem que seguir um planejamento adequado ao objetivo e ao grau de condicionamento físico do atleta, e esse planejamento tem que conter treinos com variadas intensidades, ou seja, treinos leves, moderados e fortes, mas isso quem decide é o professor que deve estar auxiliando esse atleta”, diz o instrutor.

A publicitária Flávia Veras sentiu no pé os efeitos do excesso de treino e de corridas. Em 2013, ela teve uma fascite plantar, uma inflamação do tecido denso na sola do pé, que ocorre pelo esforço excessivo da região e que causa dor e rigidez na região. “Estava em período de intensificação do treino e participando de todas as corridas que apareciam em São Luís. Um dia, treinava tiros e senti uma pontada, como se estivessem enfiando uma faca no meu pé. Continuei até terminar o tiro, mas depois não consegui andar mais”, conta.

Depois de três dias com dor, achando que tinha quebrado algo no pé, a atleta resolveu procurar ajuda e, após exames, teve o diagnóstico. “Depois de 10 dias, achei que estava bem e fui participar de uma corrida, comecei a sentir dor nos 4km e aos 7km precisei ser amparada pelos técnicos e não terminei a prova. No total, passei três terríveis meses parada, pois não conseguia andar”, relata.

Se a recuperação exigiu paciência, ela trouxe também grandes aprendizados à corredora. “Aprendi a respeitar meu corpo. Descansar também é treino. Não faço mais todas as corridas que aparecem. Fiquei mais seletiva. Se meu corpo pede para parar, eu paro. Para corredor, a coisa mais desesperadora é lesão”, afirma.

Recuperação - Melhorar o desempenho nas passadas é uma das metas dos corredores de rua, mas especialistas dizem que é preciso frear o ímpeto para garantir a recuperação muscular adequada. “Os músculos demoram cerca de 48 horas para se recuperarem, por isso o ideal é intercalar a corrida com outras atividades”, recomenda o ortopedista Fábio Rolim.

Embora a corrida exija, principalmente, o trabalho dos membros inferiores, outros grupos musculares, como os lombares, abdômen, os braços e os glúteos também são exigidos durante as passadas. “Hoje, se trabalha com a ideia de cross training, que é a combinação de exercícios para que se trabalhe diferentes grupos musculares. Assim, um dia se faz a corrida e no outro outra atividade, como musculação ou bicicleta. Assim, todos os músculos são trabalhados e fortalecidos”, informa o médico.

O fisioterapeuta André Britto diz para o atleta ficar atento para não se enganar logo no início dos treinos com a melhora imediata. “Quem corre sem orientação precisa tentar frear sua ansiedade, pois com o início dos treinos logo acontece uma melhora na condição cardiorrespiratória que poderá não ser acompanhada da mesma adaptação osteomioarticular, o que pode ser um fator de risco para lesões”, ressalta.

Para quem está começando, a orientação é começar de forma gradativa. “Tem que começar respeitando o limite do seu corpo. Para quem nunca correu, é importante começar com caminhadas e inserir as corridas, aos poucos. Sem respeito aos limites, o atleta vai se lesionar ou agravar a lesão, podendo ficar longe das corridas durante muito tempo”, finaliza Calixto Júnior.

Acessórios e gelo - Muitos atletas têm recorrido a meias de compressão, bandagens terapêuticas (kinésio taping) e gelo para melhorar o desempenho, recuperar a musculatura e evitar lesões associadas à pratica de corrida.

O fisioterapeuta André Britto explica que não existem na literatura médica comprovações científicas que embasem meias de compressão com benéficas durante a corrida. “Existe o relato de pessoas que sentiram melhora na prática, mas não existe nada publicado em revista de peso sobre o assunto”, diz André Britto.

Segundo o ortopedista Fábio Rolim, da Osteo Clínica, as meias de compressão estão relacionadas à recuperação pós-treino, pois melhoram a sensação de cansaço e peso nas pernas após provas e treinos. Elas funcionam comprimindo a musculatura e melhorando o retorno venoso, que aumenta o fluxo sanguíneo na região.

Sobre o gelo, Fábio Rolim afirma que atletas de rendimento costumam fazer grande uso. “Jogadores de futebol, por exemplo, entram em baldes ou banheiras de gelo após treinos e jogos e depois usam calças compressoras. Mas isso é recurso para atletas de alto desempenho. No caso de corredores de rua de 5km e 10 km, não existe uma grande necessidade, mas também não atrapalha se o fizer”, esclarece, indicando que o ideal é usar o gelo logo após o treino ou corrida.

Principais lesões de corrida

Canelite – Nome popular para a síndrome da tensão tibial medial, a canelite é definida como dor e desconforto na perna, causada pela corrida praticada de forma repetitiva numa superfície dura ou por uso excessivo dos flexores do pé. É a inflamação do principal osso da canela, a tíbia, que leva à dor na região póstero – medial da perna dos dois terços distais da tíbia. Condição também conhecida como síndrome do sóleo.

Tendinite de Aquiles – A condição em que ocorre inflamação ou degeneração do tendão de Aquiles, com inchaço e presença de dor. O tendão de Aquiles fica na parte de trás da perna e conecta os músculos da panturrilha aos ossos do calcanhar. Acontece por uma sobrecarga no tendão, e os motivos incluem excesso de treino, corrida em terrenos muito duros, falta de flexibilidade do músculo da panturrilha ou alterações no padrão de movimento.

Fascite plantar – Inflamação do tecido denso na sola do pé, que ocorre pelo esforço excessivo da região. Esse tecido é denominado fáscia plantar, uma aponeurose (tecido que recobre a musculatura da planta do pé) que se estende do calcâneo, osso que forma o calcanhar, aos dedos. Ela ajuda a manter o arco longitudinal do pé. A corrida e caminhada aumentam a força exercida sobre o pé, ainda mais quando a sobrecarga ultrapassa a capacidade do pé de absorver o trauma, por isso a dor.

Síndrome da banda iliotibial – Causa mais frequente de dores na lateral do joelho de corredores. A banda iliotibial é uma espécie de faixa fibrosa localizada na lateral da coxa, que nessa síndrome apresenta um atrito exagerado com o fêmur (osso da coxa) na região próxima à articulação do joelho, causando inflamação e dor no local.

Condromalácia patelar – Lesão na cartilagem anterior do joelho (patela), que pode ir de um amolecimento até uma perda completa de parte da cartilagem. Alto impacto, desequilíbrio muscular e desalinhamentos que geram sobrecarga no joelho são alguns dos fatores causadores dessa lesão. O diagnóstico e tratamento desses fatores permite o prosseguimento da prática esportiva com grande redução dos sintomas, ou seja, sem dores.

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