SÃO LUÍS - Ontem (10) foi realizado, na Unidade de Ensino Superior Dom Bosco (UNDB), o Observatório da Violência, que é uma iniciativa articulada por operadores do direito, militantes de direitos humanos e acadêmicos que tem como objetivo analisar informações relativas a mortes violentas para subsidiar a elaboração de políticas públicas.
Números
Na ocasião, foram apresentados os números de homicídios no Maranhão. Segundo os dados apresentados pelos palestrantes durante o evento, a taxa de homicídios no Estado aumentou 400 % entre 2000 e 2012, crescimento bem maior que a média brasileira, que foi de 24%.
As vítimas desses crimes são, em sua maioria, homens (92%) e negros (85%). Outro aspecto desse tipo de crime levantado é o uso de armas de fogo, que chega a 54% nos homicídios praticados no Maranhão e 74% nos crimes cometidos em São Luís. Para Wagner Cabral, professor da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), essa situação é resultado de uma maior circulação de armas, associada ao tráfico de drogas.
Nesse período de 12 anos, São Luís foi a 2ª capital brasileira com maior índice de crescimento de homicídios, perdendo apenas para Maceió (AL). Desde 2011, a capital maranhense figura na lista das 50 cidades mais perigosas do mundo, subindo de posição a cada ano: de 27ª em 2011 para 15ª em 2013.
Somente entre janeiro de 2013 e outubro de 2014 aconteceram 1.911 mortes violentas na Grande São Luís. O bairro com o maior número de homicídios foi a Cidade Olímpica, com 80 casos, seguido de áreas como o Coroadinho, Liberdade, Vila Embratel e São Francisco/Ilhinha.
Outro número destacado pelo professor foi o de linchamentos, que levou a 22 mortes nesse período. Traçando um comparativo, no primeiro semestre de 2014 ocorreram 12 linchamentos em São Luís e 50 em todo o país.
Wagner Cabral abordou, ainda, os homicídios ocultos, que ficam de fora das estatísticas da Secretaria de Segurança Pública (SSP). De acordo com o palestrante, não são computados cerca de 20% dos homicídios. Entram nessa conta os roubos seguidos de morte, lesão corporal seguida de morte e todas as mortes ocorridas no sistema prisional.
Para o palestrante, toda essa situação de violência movimenta uma quantidade imensa de recursos. A segurança pública do Maranhão, por exemplo, teve o seu orçamento aumentado de R$ 488 milhões em 2004 para mais de R$ 1 bilhão em 2014. O Complexo Penitenciário de Pedrinhas viu seu orçamento saltar de R$ 3 mi para R$ 180 mi em 10 anos. No entanto, as taxas de criminalidade só têm aumentado e a situação no sistema prisional torna-se cada vez pior.
De acordo com Wagner Cabral, a terceirização de serviços essenciais, como a gestão do sistema prisional, tornou-se um grande negócio. Segundo ele, o segmento da segurança privada movimenta, no Brasil, cerca de R$ 45 bilhões anuais.
Alternativas penais
O juiz Douglas Martins, que também foi um dos palestrantes, abordou ideias cristalizadas na sociedade a respeito da segurança pública, como as de que "segurança é polícia na rua", "mais punição leva a menos violência", "necessidade de sofrimento no sistema prisional" e "bandido bom é bandido morto". Segundo ele, o Poder Público tem agido, justamente, no atendimento a essas ideias, o que não tem trazido resultados positivos.
Esse tipo de pensamento foi condensado em um vídeo no qual o deputado Jair Bolsonaro defende a pena de morte e afirma que "a única coisa boa que existe no Maranhão é Pedrinhas". "Faltou avisar ao Bolsonaro que o Maranhão, que tem esse presídio violento é um dos Estados em que a violência mais cresce. Se presídio violento resultasse em segurança pública, o Maranhão seria o local mais seguro do Brasil", enfatizou o palestrante.
Questionando esse raciocínio, o palestrante lembrou que, há 10 anos, o número de presos no país era bem menor (239 mil presos contra cerca de 700 mil atuais) e que o aumento da população carcerária não resultou em melhoria na segurança pública. Além disso, o crescimento do número de encarcerados acaba com o argumento de que o Brasil é o país da impunidade.
A taxa de homicídios nesse período, no entanto, não sofreu grandes alterações. "Não há nenhuma oscilação positiva da segurança ao aumentarmos a taxa de encarceramento no Brasil", afirmou.
Douglas Martins comparou a situação maranhense à do estado do Piauí, que tem o menor número de presos do país e ocupa a segunda posição entre os Estados mais seguros.
Números apresentados pelo juiz mostram que o Maranhão era o Estado com a menor taxa de homicídios em 1998 (cinco a cada 100 mil habitantes). Entre 2002 e 2012, essa taxa aumentou 162%. "Devemos, pelo menos, desconfiar que esse estouro da violência tem alguma relação com as violentas rebeliões em Pedrinhas e a consolidação das facções do crime organizado", frisou. De acordo com o palestrante, todas as tentativas de alternativas penais propostas pelo Executivo e Judiciário fracassaram. Para ele, isso acontece porque as pessoas têm consolidada a ideia de que a questão penal não tem nada a ver com segurança pública.
Douglas Martins apresentou, ainda, diversos "princípios" presentes nos estatutos das organizações criminosas que atuam nos sistemas prisionais de todo o país. Além do apoio entre os integrantes, são explicitados os seus deveres que, em caso de descumprimento, são geralmente punidos com a morte.
Para o palestrante, o encarceramento não é a solução para a questão da segurança pública. O juiz afirma que a questão é mais complexa e a sensação de medo da população gera um mercado no qual circula muito dinheiro. "Talvez desse debate, dessa discussão, possamos encontrar outro caminho", finalizou.
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