COLUNA
Ibraim Djalma
Ibraim Djalma é procurador federal
Ibraim Djalma

Filiação Socioafetiva

Afinal de contas, a filiação socioafetiva é uma nova modalidade de paternidade e de maternidade? E seus efeitos legais como ficam?

Ibraim Djalma

Afinal de contas, a filiação socioafetiva é uma nova modalidade de paternidade e de maternidade? E seus efeitos legais como ficam? 

Historicamente, não é novidade que o direito sempre esteve atrelado a ideia de regulação social, seja em épocas remotas em que era transmitido essencialmente por meio oral, nos períodos pré-históricos; seja com a evolução da escrita, que teve seus melhores exemplos na Civilização Egípcia e na Mesopotâmia.

Mas a verdade é que o direito tem sua existência ontologicamente ligada ao fluxo social. Ou seja, não existe sem sociedade. Por isso, no decorrer da história se confunde diversas vezes com a religião e com a política, num flerte de recorrentes idas e vindas que denuncia a clara feição de regulador social.

E essa compreensão fica mais aguçada quando atinge aspectos pessoais e básicos de sobrevivência, em um grau de sensibilidade que deve, quando possível, seguir a mesma sincronia das evoluções sociais. Sem atraso.

Por isso o direito previdenciário e o assistencial ocupam um dos primeiros lugares na fila quando o assunto é necessidade constante de atualização, já que seus propósitos estão intimamente ligados à sobrevivência do cidadão.

 

E aqui se insere um novo perfil social acobertado também pela previdência. A filiação socioafetiva.

 

A sociedade já conhecia essa figura - que certamente não é novidade -, mas tem ganhado notoriedade com os reconhecimentos institucionais.

 

A filiação socioafetiva é um reconhecimento jurídico de maternidade/paternidade em razão do vínculo de afeto sem ligação biológica, conferindo aos menores a condição de filhos, tal qual estabelecido aos biológicos.

 

Na prática a recorrência é para casos de enteados (as), em que o afilhado vive sob os cuidados do padrasto ou da madrasta e tem uma relação afetiva revelada não somente na convivência familiar, mas na proteção e assistência alimentar e patrimonial.

 

No âmbito jurídico, os primeiros passos foram sinalizados pela melhor doutrina, ao mensurar a importância desse evento social que não podia ser mais negligenciado. Afinal, a existência de uma convivência paternal/maternal com alguém que na prática ostentava a mesma posição que os filhos biológicos se revelava desigual – para não dizer injusta – quando o desfecho em caso de morte dos pais ou necessidade de proteção e sustento eram reconhecidas somente para os filhos de sangue, como se costuma dizer.

 

Esse cenário, escorado tão somente na ausência de previsão legal taxativa – onde se insere a discussão sobre a necessidade de adequação do direito aos conformes da sociedade – sofreu revés com o avanço de reconhecimentos institucionais, como o Provimento n.63 de 2017 do Conselho Nacional de Justiça - CNJ, hoje atualizado pelo Provimento n.149 de agosto de 2023, do mesmo órgão.

 

O avanço inclusive permite hoje o registro da filiação socioafetiva diretamente no cartório de registro civil para filhos acima de 12 anos de idade. Na certidão de nascimento constarão dois pais ou duas mães – a filiação biológica e a socioafetiva.

 

No seio previdenciário, o INSS já sinalizou pelo reconhecimento dessa filiação, cujos efeitos previdenciários desembocarão em benefícios como pensão por morte, salário família e auxílio reclusão.

 

A ideia é garantir a mesma proteção dada aos filhos biológicos, sem qualquer discriminação. Como já acontece com a adoção. E isso certamente resultará nos mais diferentes efeitos jurídicos, como sucessórios, alimentares, previdenciários e tantos outros ainda a serem amadurecidos.

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O primeiro passo já foi dado, e o direito não tardou em atender as inovações sociais ao proteger quem na prática lastreou anos de vida sendo tratado como filho (a), inclusive nutrindo afetos, hábitos, rotinas e vulnerabilidades em conformidade com todo um contexto familiar vivido anos a fio, cuja base está no princípio da confiança e autoproteção.

 

Ao Estado cabe o papel de adequar tão logo o direito a essas mudanças sociais, priorizando a sintonia entre os fenômenos sociais e o amparo legal correspondente na maior brevidade possível. 

 

A filiação socioafetiva é somente um dos notáveis exemplos. Mas o recado principal está em compreender que tão importante quanto reconhecer direitos é criar mecanismos eficazes de garanti-los.

 

Por sinal, falando em adequação social, a figura do menor sob guarda é um dos exemplos que merece atenção especial. Por isso ficará para o próximo artigo.

 

Da série “Proteção aos menores”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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