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Coluna do Sarney
José Sarney é ex-presidente da República.
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O mistério do tempo

A marcação dos anos foi uma invenção do homem, porque o tempo é a eternidade: não tem princípio nem fim.

José Sarney

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A marcação dos anos foi uma invenção do homem, porque o tempo é a eternidade: não tem princípio nem fim. O tempo do homem está na marcação repetitiva dos relógios, contando os anos, as horas, os dias, nessa rotina dos ponteiros rodando do mesmo jeito, acompanhando o Sol a nascer todos os dias, na luz aberta das manhãs, dos crepúsculos vermelhos e da beleza do pôr-do-sol. E da Terra girando em torno do seu eixo, também em torno do Sol, acompanhando seus irmãos, os planetas que também seguem seu curso. E de nosso sistema solar, também, pelas leis do criador, caminhando pelos espaços em busca de outros Universos, na teoria de que é tudo feito de incontáveis Universos.

Os versos de T. S. Eliot, que sempre cito, dizem tudo: “O tempo presente e o passado / estão ambos talvez no tempo futuro, / e o tempo futuro está contido no tempo passado.” Já o Padre Vieira explicava que “se no passado se vê o futuro, e no futuro se vê o passado, segue-se que no passado e no futuro se vê o presente, porque o presente é o futuro do passado, e o mesmo presente é o passado do futuro”. 

Ao meditar sobre a vida na contagem dos anos, a expressão que me ocorre é a de Hannah Arendt, que fala da obrigação de nossa “gratidão pelo mundo”.

Então lembro meu pai, que tinha por tradição passar o Natal e a noite de Ano Novo rezando — ele dizia que era mais para agradecer o Ano Velho, que todos costumam caricaturar, do que o ano que chegava. O Ano Velho já era a graça da vida e o Ano Novo era a esperança, o nosso desejo de que fosse bom, de paz e de união. Agradecer a Deus o ano que passou e pedir a Ele que o Novo Ano traga felicidade, transformando a sua chegada numa grande festa universal de confraternização entre os homens, pedindo a paz; as duas: a paz entre os homens, os povos e as nações, as pessoas e os povos; e a paz interior, esta que é tranquilidade, a ausência de males, a minha paz, eu comigo mesmo.

Assim como o meu pai, a cada ano saúdo o Ano Novo, mas minha gratidão também se volta para o Ano Velho. Quando transpomos a marca do tempo, recordo que, nos 365 dias que acabamos de viver, nosso coração a cada dia bombeou 343 litros de sangue por hora e três milhões de litros no ano, para oxigenar os 10 trilhões de células do nosso corpo, no milagre da vida, na harmonia dessa máquina que nos distingue dos outros animais pelo pensar. Ela alimenta o nosso sonho de sonhar, os sentimentos do amor, da fraternidade, da paixão, da solidariedade humana. Todos que vivemos e estamos aqui na Terra podemos louvar o ano que passou e renovar esperanças sobre o que vem, porque somos vitoriosos. Na evolução, somos produtos de uma linhagem em que tudo deu certo. Jay Gould, pensando sobre isso, observou: “Nossa espécie nunca se rompeu nenhuma vez, em bilhões de momentos em que poderia acabar”. E quantas espécies acabaram.

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Bandeira Tribuzi, nosso poeta ainda a ser descoberto nacionalmente, como o foi Sousândrade, tem um poema sobre essa Máquina do Mundo, em que ele diz “que sonho raro / será mais puro e belo e mais profundo / do que esta viva máquina do mundo”.

Para mim esse mistério é tão grande e tão inexplicável quando compreendemos que toda ciência é inevitável, mas ela só se completa na plenitude da fé. É a presença de Deus na obra da criação que fecha e acaba o ciclo da dúvida.

O novo Ano abre largas as portas da esperança, nesta convenção do tempo que assimilamos para definir que será melhor o amanhã e, já vendo isso acontecer, podemos, mais uma vez, desejar bons anos para todos.

Um Feliz 2024 aos nossos leitores!

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