Desafios

Pesquisas buscam diminuir o impacto ambiental da mobilidade com biocombustíveis

O setor do transporte foi a segunda maior causa de emissões de CO2.

Agência Brasil

Atualizada em 27/03/2022 às 11h22
Pesquisas estudam substituir a cana-de-açúcar pela cana-energia. (Foto: Agência Brasil)

BRASÍLIA - Diminuir os impactos ambientais é um dos desafios de quem pensa a mobilidade, contando com novas tecnologias e pesquisas para ampliar o uso de combustíveis sustentáveis. O setor do transporte foi a segunda maior causa de emissões de dióxido de carbono (CO2) no Brasil: representou 11% do total bruto de 1.927 bilhões de toneladas, ficando atrás apenas do setor agropecuário, segundo pesquisa realizada pelo Observatório do Clima.

Atualmente os biocombustíveis representam 38% da matriz energética brasileira, sendo a maior parte sucroenergético (álcool, açúcar e biomassa da cana) ou proveniente das oleoginosas, como soja, dendê, girassol, babaçu, amendoim, mamona e pinhão-manso.

Outros combustíveis, como o biodiesel de resíduos da indústria de alimentos e o biometano, têm ganhado espaço, ainda de forma discreta. “A biomassa residual, os resíduos agrícolas, os resíduos dos matadouros e resíduos sólidos urbanos têm grande potencial”, diz o coordenador geral de tecnologias setoriais do Ministério da Ciência Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), Eduardo Soriano.

Em todo o país, diversas pesquisas estão em andamento com o objetivo de implementar o uso de combustíveis sustentáveis. Na área de produção de etanol, pesquisas indicam que o uso da espécie cana-energia aumenta consideravelmente a média de produtividade nas plantações.

“A média de produtividade de cana[-de-açúcar], por exemplo no Centro-Sul, é 140 toneladas por hectare. Nós estamos produzindo a cana[-energia], hoje em dia, em forma de pesquisa, já está chegando a 200 toneladas por hectare e pode chegar a 300 toneladas por hectare, ou seja, o Brasil pode aumentar e muito a sua produção de etanol sem usar um hectare a mais de terra”, afirma Soriano.

A produção de biodiesel a partir de microalgas é outra pesquisa em andamento, já que esses pequenos organismos são oleoginosas de rápido crescimento, que não competem com a produção de alimentos, pois podem ser produzidos em áreas não propícias para a agricultura. “Isso é uma tecnologia nova que ainda está em laboratórios, o mundo inteiro ainda está pesquisando”, diz o representante do MCTIC.

Combustível para aviação

Mas a grande novidade na área de pesquisa para combustíveis aplicados ao transporte não diz respeito às emissões de transportes terrestres, mas sim no combustível renovável para aviação, com pesquisas no Brasil para uso de energia elétrica e de bioquerosene.

A primeira é a rota de síntese, que usa a energia elétrica para separar o hidrogênio e o oxigênio da água para produzir o gás de síntese. Esse gás se mistura a outros gases para formar um combustível adequado para a aviação.

No final do mês de junho, Brasil e Alemanha firmaram um acordo para a construção de uma planta piloto no Brasil para desenvolver pesquisas com o novo combustível nos próximos cinco anos, que possam ser produzidos em diversos locais.

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“A ideia é produzir em pequena escala, porque as grandes refinarias produzem em larga escala, então, você precisa de uma infraestrutura muito grande e gasta mais combustível para transportar o querosene até lugares distantes, como a Amazônia, igual ocorre com o diesel nas térmicas. Queremos, no futuro, criar uma rota tecnológica, um novo padrão para ser replicado em lugares mais distantes”, explica Soriano.

A outra linha de pesquisa é a biológica, já em estudo há alguns anos no Brasil, com testes bem-sucedidos do uso do bioquerosene de aviação (BioQAV) produzido a partir de oleoginosas. Em novembro de 2010, uma companhia aérea brasileira realizou o primeiro voo com um Airbus A320 abastecido com uma mistura de 50% do combustível sustentável. A aeronave sobrevoou por 45 minutos o Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro.

Nos últimos anos, companhias aéreas brasileiras adotaram cerca de 4% de adição do BioQAV no combustível. Os líderes mundiais no uso de biocombustíveis nos transportes aéreoe e nas pesquisas no setor são Estados Unidos e Portugal. “O Brasil, como líder mundial em biocombustível, não pode perder essa corrida, então nós estamos empenhados em desenvolver essa questão dos bioquerosenes de aviação”, diz Eduardo Soriano.

RenovaBio incentiva biocombustíveis

Já nos transportes terrestres, embora o Brasil tenha uma política bastante avançada na área de biocombustíveis, que garante a mistura de 36% do etanol à gasolina e 8% do biodiesel ao diesel de origem fóssil, ainda existem muitos entraves para que os combustíveis sustentáveis ganhem mais mercado. Segundo o diretor de biocombustíveis do Ministério de Minas e Energias, Miguel Lacerda, um dos principais dificultadores é a falta de diferenciação tributária para o setor.

Para ele, é necessário um marco regulatório que permita condições estáveis para o mercado de biocombustíveis, de modo a superar os altos custos com importação de combustíveis fósseis – apesar de o Brasil ser autossuficiente, importa petróleo do tipo leve, mais fácil de extrair gasolina e outros derivados. A importação ainda sobrecarrega os portos brasileiros e aumenta o risco de desabastecimento, segundo Lacerda.

O diretor do ministério lembra que a produção de etanol do Brasil já foi a maior do mundo, mas hoje alcança a metade do líder mundial, Estados Unidos. “Nós estamos correndo o risco de perder décadas de investimentos em um modelo baseado em biomassa”, afirma.

Segundo o diretor superintendente da União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio), Donizete Tokarski, esse marco regulatório deve ser criado de acordo com a política do RenovaBio, que o governo pretende enviar ao Congresso para aumentar a produção de biocombustíveis, que contou com a participação de vários setores e foi aprovado pelo Conselho Nacional de Políticas Energéticas.

Tokarski explica que a aprovação do RenovaBio premia o uso de biocombustíveis com eficiência energética, por meio dos Certificados de Redução de Emissão (CREs), permite que o mercado regule o valor da tonelada de carbono e aumente a competitividade. “O programa RenovaBio é, em síntese, uma maneira de descarbonizar os combustíveis do Brasil”, diz.

O setor está mobilizado para convencer o Legislativo a aprovar uma lei que regulamente a proposta do RenovaBio. “Ou ela vai ser tramitada por Medida Provisória, e aí nós temos ainda no curto prazo essa política que valoriza [os biocombustíveis], ou ainda ela pode ser tramitada por Projeto de Lei e aí o prazo depende do processo dentro da Câmara e no Senado”, explica Miguel Lacerda.

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