Fisiculturismo

Atletas lutam para superar preconceito: "temos coração"

Fisiculturistas relatam tristeza com situação enfrentada diariamente.

Paulo de Tarso Jr./Imirante Esporte

Atualizada em 27/03/2022 às 11h40
Silena Rosa exibe excelente forma durante Campeonato Maranhense. (Foto: Divulgação)
Silena Rosa exibe excelente forma durante Campeonato Maranhense. (Foto: Divulgação)

SÃO LUIS – Corpos esculturais e definidos não surgem da noite para o dia. Para se alcançar determinado tipo de padrão estético, atletas de fisiculturismo sofrem e não é pouco. Além das difíceis rotinas de treinamentos que necessitam de algumas horas na academia e da necessidade de abdicar de alguns tipos de alimentos, quem pratica tal modalidade é vítima de preconceito. E este, talvez, seja um dos problemas mais complicados para um fisiculturista lidar diariamente.

Ser julgado por quem não conhece a sua vida e ser alvo de piadas são situações comuns para pessoas que resolveram adotar a prática do fisiculturismo. Um dos principais nomes da modalidade no Maranhão, Silena Rosa, revela já ter tido vontade de desistir da carreira por causa do preconceito das pessoas.

“Existe muito preconceito. Hoje mesmo [no último sábado] a minha patrocinadora postou uma foto, e um rapaz botou em baixo se era realmente um homem ou uma mulher. Eu levo hoje muito na esportiva. Em supermercados, shoppings, a gente geralmente escuta umas piadas. No começo, é difícil. Se você não preparar o teu psicológico, fica um pouco abalada. Eu, no começo, tive vontade de desistir porque ficava triste com as piadas. Hoje, eu ignoro os comentários. Finjo que não é comigo e levo na esportiva. Eu tenho pena de pessoas que têm preconceito. Pessoas que têm preconceito, não só comigo, são pessoas pobres de espírito”, disse.

Orlando Gomes revela ser alvo de preconceito diariamente. (Foto: Paulo de Tarso Jr./Imirante Esporte)
Orlando Gomes revela ser alvo de preconceito diariamente. (Foto: Paulo de Tarso Jr./Imirante Esporte)

Vice-campeão mundial de Fisiculturismo em 2013, Orlando Gomes Martins lamenta a forma como a sociedade trata atletas que praticam a modalidade. Já chamado de “monstro”, ele lembra que o que difere um fisiculturista de uma pessoa “normal” é apenas o corpo. “As pessoas chamam a gente de brutamontes, de monstros e, na verdade, nós não somos isso. Na verdade, nós somos seres humanos igual a qualquer um. Nós temos coração, nós temos sentimentos. A única diferença é o corpo”, destacou.

“Sofremos bastante preconceito. Nós, atletas de fisiculturismo, que temos o corpo um pouco avantajado, somos julgados. As pessoas nos veem na rua e acho que elas se incomodam. Nos chamam logo de ‘bombadão’. Eu escuto isso no meu dia a dia. É como se fosse o meu almoço e meu café da manhã. São assim as críticas, mas, para mim, isso só me incentiva até porque eu me conheço, sou um atleta de fisiculturismo há 16 anos e creio que todos os atletas de fisiculturismo sofrem este tipo de preconceito”, complementou Orlando Gomes.

Mulher é mulher

Por serem fisiculturistas, mulheres são vítimas de preconceito. (Foto: Paulo de Tarso Jr./Imirante Esporte)
Por serem fisiculturistas, mulheres são vítimas de preconceito. (Foto: Paulo de Tarso Jr./Imirante Esporte)

“É homem ou mulher?”... “Que coisa feia”... “Para que ser tão musculosa?”... Estas são algumas das frases que mulheres fisiculturistas costumam ouvir. Estariam elas querendo se tornar homens? Na verdade, não. O fato de alguém querer ter um corpo mais ou menos musculoso não representa necessariamente este desejo de “virar homem”. Para os fisiculturistas, as pessoas que têm tal pensamento não param para pensar que aquele corpo com músculos mais avantajados seja a forma que deixa um atleta feliz.

Para as próprias atletas, respeitar as diferenças e os gostos das pessoas é fundamental. Pena que, na prática, isso está longe de ser realidade. “A questão de você ter músculos, alguns acham que você é masculina, se você é homem, se é uma mulher, se é um ‘traveco’, se toma 'bomba'. Esses tipos de piadas machucam muito a gente. Ser atleta é o ano inteiro. Para ter um corpo preparado, travado, musculoso, você tem que abdicar de algumas alimentações, de noitadas, de tudo. Não é fácil. Eu fico triste porque as pessoas não conhecem a minha vida, a minha história. Infelizmente, a gente se depara com isso”, explica Silena Rosa.

E se engana quem pensa que o preconceito está apenas na rua. Dentro de casa, os atletas de fisiculturismo também são alvo de críticas. Natural de Açailândia, Andreia Cristina é um exemplo de uma pessoa que sofreu certo tipo de preconceito por parte da própria família. Ela, que possui um filho de 14 anos, revela que sua opção por ter um corpo mais musculoso não era vista com bons olhos pelos outros.

“Sempre vem aqueles falatórios de que está parecendo homem, de que está feia. Na própria família tem uns que apoiam e outros não. A gente tem que ter a cabeça muito boa, gostar muito do esporte, senão abandona. Mas eu gosto do esporte e não vou desistir por isso não. Prefiro como estou hoje. Eu sempre batalhei para chegar nesse corpo porque não é fácil. E hoje estou satisfeita com meu corpo, mas sei que tenho que melhorar mais”, afirmou.

Atleta se apresenta durante Campeonato Maranhense de Culturismo e Fitness 2015. (Foto: Paulo de Tarso Jr./Imirante Esporte)
Atleta se apresenta durante Campeonato Maranhense de Culturismo e Fitness 2015. (Foto: Paulo de Tarso Jr./Imirante Esporte)

Nada de “bombas”

Ser atleta de fisiculturismo significa estar limpo de anabolizantes. O preconceito alimentado pela sociedade é que fisiculturista só é musculoso porque usa “bomba”. Segundo o presidente da Federação Maranhense de Culturismo, Musculação e Fitness (FMCM), Belizário Mendes de Sousa (Soldado), a federação é bastante criteriosa em seus campeonatos. Só se apresenta em uma competição quem estiver totalmente “limpo”.

“Existe uma grande diferença de pessoas que tomam anabolizante para um atleta. Atleta não toma 'bomba', ele se cuida, tem uma disciplina alimentar. Hoje, esse preconceito já está bem mais light, mas ainda existe. A sociedade nunca vai mudar. Nós, como fisiculturistas, a gente não se importa com isso. Deixa falarem, vamos continuar. E, com isso, estamos ganhando nosso espaço”, disse.

Presidente da FMCM, Belizário de Sousa, garante que não há espaço para anabolizantes nos torneios. (Foto: Paulo de Tarso Jr./Imirante Esporte)
Presidente da FMCM, Belizário de Sousa, garante que não há espaço para anabolizantes nos torneios. (Foto: Paulo de Tarso Jr./Imirante Esporte)

Aos 27 anos, Karoline Pinho é uma atleta de fisiculturismo. Aos 12 anos, iniciou na musculação e, posteriormente, decidiu aderir à modalidade esportiva. Ela conta que o problema é que as pessoas não acreditam ser possível ganhar músculos apenas com treinos e alimentação ideal.

“Ninguém acha que a gente consegue alcançar este patamar, este nível de estrutura corporal só com uma dieta e treino severo”, explica. Para a atleta, ser fisiculturista é gostar de superar limites em busca de se sentir bem. “É superação de limites. A gente vem aqui para se superar. Aqui a gente não tem retorno financeiro, então é realização pessoal. É você se olhar numa foto ou num espelho e ver que aquilo ali está bonito, que foi você quem construiu aquele corpo. Não tem outra justificativa. É amor ao esporte. Quando eu me olho no espelho, eu me sinto bem”, finalizou.

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