Dom Pedro Casaldáliga, símbolo da luta pelos excluídos, se aposenta

Agência Brasil

Atualizada em 27/03/2022 às 15h18

BRASÍLIA - Depois de 35 anos de luta pelos sem-terras e índios no Mato Grosso, uma merecida aposentadoria.

Mesmo assim, para o bispo dom Pedro Casaldáliga, que completou 75 anos, a luta continua. “O Brasil ainda tem muitas questões a resolver e uma enorme dívida social para pagar”, afirma o religioso.

Conforme norma da Igreja Católica, o bispo chegou na idade de abandonar a diocese que, na região do Araguaia, virou símbolo de resistência popular no mundo todo. Uma carta-renúncia enviada ao Vaticano, em 17 de fevereiro, encerrou, formalmente, sua atuação em uma das regiões mais conflituosas do planeta. A última homenagem prestada a D. Pedro foi o título de "honoris causa", concedido hoje pela Universidade Federal do Mato Grosso.

Dom Pedro Casaldáliga nasceu em Barcelona, na Espanha, em 16 de fevereiro de 1928, filho de um lavrador-vaqueiro. Jovem, entrou para a ordem dos Missionários Claretianos. Chegou ao Brasil em 1968, o mesmo ano que o Ato Institucional Nº 5 (AI-5) foi editado. Isso talvez fosse um sinal de suas relações com a ditadura militar (1964-85), sempre marcada por censuras, ameaças e prisão domiciliar.

Em 1971, foi sagrado bispo. No discurso de posse, fez duras críticas aos latifundiários. Por conta disso, passou a ser perseguido por pistoleiros contratados por grandes fazendeiros. “Já perdi a conta das vezes que minha cabeça foi posta a prêmio e que me disseram que não veria outro dia. Mas Deus sempre me protegeu”, diz D.Pedro.

O inconformismo levou o bispo a entrar em confronto até com o Vaticano. Todo o bispo deve visitar o Papa de cinco em cinco anos. Depois de sua nomeação, D. Pedro passou 17 anos sem ver o Santo Padre. Quando, finalmente, foi a Roma, acabou criticado por apoiar o regime sandinista da Nicarágua e a luta dos camponeses da América Central. Foi aconselhado a se calar. Não se calou.

Foi ameaçado com o ”silêncio obsequicioso”, uma punição da Igreja que proíbe declarações públicas. Continuou fazendo suas críticas.

Hoje ele vê vários avanços no Brasil e no Mato Grosso. “Ainda há muita pobreza e violência, mas a consciência aumentou muito e a democracia começa a se tornar real em nosso país”, acredita. Segundo ele, o cidadão urbano estaria se conscientizando que o problema da falta de terra não é só do camponês, mas de todos os brasileiros. “Espero que o Governo Lula cumpra seu programa e faça uma ampla reforma agrária. A esperança é grande”, afirma. O bispo considera o latifúndio injusto por natureza.

Seus colegas religiosos elogiam a firmeza de caráter e a simplicidade do bispo. “Aprendi a respeitar a figura humana exemplar de D. Pedro, um homem que dedicou toda sua vida ao evangelho e se colocou a serviço do povo com uma coragem extraordinária”, diz Dom Raimundo Damasceno, ex-secretário geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) por oito anos, atualmente bispo auxiliar da cúria de Brasília. Dom Raimundo diz que poucos se mantiveram tão firmes na luta pela salvação integral do homem, que passa pela dignidade e justiça social, como Dom Pedro. “Mesmo assim, ele conseguiu continuar sendo alguém humilde e afável”, diz.

Dom Pedro Casaldáliga ainda não definiu os planos para depois da aposentadoria. Não pretende retornar à Europa, mas não sabe se continua no Brasil. “Não quero deixar o país, pois sua gente me aceitou como um deles, mas isso não depende só de mim”, ele disse. Outra preocupação é com futuro do Brasil e da América Latina. O bispo não quer que a Área de Livre Comercio da América (Alca) se torne um novo foco colonialismo no continente.

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