10 anos da explosão do CLA

Parentes de vítimas de explosão aguardam explicações e apoio do governo

Compromissos, firmados com famílias das vítimas da explosão da plataforma em Alcântara, não foram cumpridos.

Diego Torres/Imirante

Atualizada em 27/03/2022 às 12h04

ALCÂNTARA - Desde 2003, o dia 22 de agosto tem sido marcado por homenagens para as 21 famílias das vítimas da explosão da plataforma do Centro de Lançamentos de Alcântara (CLA), distante pouco mais de três mil quilômetros de Alcântara, no Maranhão. Doris Cezarini, Adriana Helena Gonçalves da Silva, José Oliveira são o que se pode chamar, no jargão militar, de “linha de frente” da Associação dos Familiares das Vítimas do Acidente no Veículo Lançador de Satélites.

Eles tratam o Programa Aeroespacial Brasileiro com um misto de esperança, otimismo e indignação. A pressa é o que, para as famílias, pode explicar parte do que houve no início da tarde daquela fatídica sexta-feira.

“Gostaria de dizer que (a morte dos nossos familiares e amigos) não foi em vão, mas, 10 anos depois, o que constatamos é que, além de em vão, a situação está ainda pior. Compromissos firmados pelo governo não foram cumpridos e não foi só o programa aeroespacial brasileiro que sofreu com a perda, mas a memória de quem morreu não é respeitada.”

A afirmação é de José Oliveira, irmão de Rodolfo Donizetti Oliveira que, morreu na explosão da plataforma do CLA. Sobre os responsáveis pelo acidente, ele é ainda mais incisivo. “FHC matou, e Lula enterrou”, diz referindo-se à forma como o governo federal trata o assunto. Para Oliveira, não é somente descaso que vem ocorrendo, mas falta de respeito com a memória das vítimas e, principalmente, com os parentes.

As “pendências” do governo federal com as famílias das vítimas vão desde a suspensão de direitos como plano de saúde ao pedido de penhora de bens pela União como forma de garantir o ressarcimento de valores pagos de forma errada. Oliveira explica que lacunas na legislação permitiram que a interpretação para a cláusula do contrato que falava sobre uma bolsa de educação cancelada antes do prazo pré-estipulado. O convênio médico, também, foi cancelado sem a prévia comunicação aos usuários. A solução dada por um militar que recebeu uma comissão de familiares foi sucinta: “Eles podem pagar pelo Grêmio”.

 Foto: Divulgação.
Foto: Divulgação.

Doris Cezarini é viúva do engenheiro Antônio Sérgio Cezarini. Com os dez volumes do Inquérito Policial Militar, recortes de jornais paulistas e maranhenses e medalhas de mérito concedidas pela Aeronáutica sob a mesa, a aposentada confessa que, até hoje, se pergunta sobre o que seu marido pensava sobre o projeto. “Às vezes, eu me pergunto: Será que o Sérgio sabia que uma tragédia poderia ocorrer ali?”.

As medalhas de mérito concedidas pelo alto comando do Ministério da Defesa a cada uma das vítimas e os títulos de heróis contrastam com o sentimento da viúva. “É assim que eles tratam seus heróis? Essas medalhas representam mais para eles do que para nós. Hoje, quase não tem nenhuma importância para nós”.

Sobre a possibilidade de sabotagem, levantada à época e confirmada após a divulgação de documentos oficiais pelo Wikileaks, a aposentada refuta e não acredita que o marido pudesse saber de algo que comprometesse o sucesso da operação, entretanto, a pressa em ver o VLS em operação chamou a atenção da Comissão de Investigação, como pode ser visto no trecho a seguir obtido a partir do Inquérito Policial Militar, instaurado em outubro de 2003.

 Foto: Divulgação.
Foto: Divulgação.

“[A Comissão de Investigação] Constatou que o estado das caneletas e das caixas de inspeção por onde passam os cabos do sistema operacional estão em condições inadequadas, com risco de comprometimento da integridade dos cabos, devido ao acúmulo de água, o que é lamentável para uma instalação militar destinada a lançamentos de foguetes”.

Investimentos

Outro ponto que, para as famílias das vítimas, continua sem explicação é o investimento financeiro e intelectual. Segundo relatório de recursos para a área espacial do Centro de Treinamento da Aeronáutica entre os anos de 1990 até 2003, apresentado por José Oliveira, houve uma redução de 76% no volume de recursos: enquanto que, em 1990, o governo investiu R$ 15 milhões, em 2003 – ano do acidente – o montante não ultrapassou R$ 3,6 milhões.

Nesses 10 anos desde a explosão, apenas dois concursos foram feitos para a área de tecnologia, e o número de oficiais ingressantes tem sido menor que o de aposentados. Sobre esta situação, Oliveira lembra uma situação inusitada, presenciada há pouco tempo. “Nós fomos buscar informações sobre o processo, e o responsável pela comunicação era um oficial da reserva, que havia retornado para suprir uma deficiência de pessoal”, descreveu.

Leia outras notícias em Imirante.com. Siga, também, o Imirante nas redes sociais Twitter, Instagram, TikTok e canal no Whatsapp. Curta nossa página no Facebook e Youtube. Envie informações à Redação do Portal por meio do Whatsapp pelo telefone (98) 99209-2383.