Tragédia em Bacuri

Sem fiscalização efetiva, tragédias como a de Bacuri podem se repetir

Auditor da CGU faz um panorama da situação do transporte escolar no Maranhão.

Maurício Araya / Imirante.com

- Atualizada em 27/03/2022 às 11h55
 Acidente com caminhonete na cidade de Bacuri. Foto: César Hipólito / TV Mirante.
Acidente com caminhonete na cidade de Bacuri. Foto: César Hipólito / TV Mirante.

SÃO LUÍS – Uma tragédia anunciada: o Imirante.com mostrou, na semana passada, que, em 2012, a Controladoria Geral da União (CGU) apontou as condições precárias do transporte escolar na cidade de Bacuri, a 520 km da capital maranhense. Um acidente, na terça-feira (29), resultou na morte de oito estudantes de ensino médio, na rodovia estadual MA-303.

Segundo a CGU – órgão responsável por fiscalizar a aplicação de recursos federais –, os quatro automóveis, contratados pela prefeitura para fazer o transporte escolar, estavam em condições impróprias para o uso de alunos, já que eram fabricados para transporte de cargas – conhecidos como "paus de arara" –, e não de passageiros. Dados do Portal da Transparência nos Recursos Públicos Federais mostram que, de 2011 a 2013, o Ministério da Educação repassou R$ 315.525,59 diretamente para o município de Bacuri, recursos que deveriam ser destinados, exclusivamente, para o apoio ao transporte escolar. No mesmo sentido, o Tribunal de Contas da União (TCU) também apontou problemas no transporte escolar da cidade: nos pregões presenciais nº 5/2011 e nº 9/2012 a Prefeitura de Bacuri recebeu, respectivamente, R$ 529.342 e R$ 623 mil, que deveriam ser aplicados para a mesma finalidade.

 Welliton Resende, auditor da CGU no Maranhão. Foto: Maurício Araya / Imirante.com.
Welliton Resende, auditor da CGU no Maranhão. Foto: Maurício Araya / Imirante.com.

De acordo com o ex-analista do Tribunal de Contas do Estado do Maranhã (TCE-MA) e auditor da CGU no Maranhão, Welliton Resende, à época, ficaram constatadas diversas irregularidades. "Foram constatados que os ônibus não apresentavam os requisitos mínimos para o transporte de crianças, que são exigidos pelo código nacional de trânsito (o Código de Trânsito Brasileiro – CTB). Não possuíam cintos de segurança, bancos quebrados, enfim. E veículos inadequados, como caminhonetes com bancos improvisados", disse em entrevista ao Imirante.com nesta segunda-feira (5) – ouça na íntegra.

Os recursos, segundo as investigações, foram utilizados para a contratação de duas empresas, sendo uma delas com sede em São Luís. Os auditores da CGU, no entanto, não conseguiram localizar a empresa. "A gente verificou que em 2011 e 2012, em Bacuri, ou seja, na gestão passada, foram duas empresas contratadas, em que houve uma licitação, um pregão. As duas foram contratadas a um valor total de R$ 1,6 milhão para fazer o transporte. Uma delas, a Napoli Serviços, de acordo com o relatório, ficaria localizada na rua dos Afogados, aqui no Centro (de São Luís), e a CGU não conseguiu localizar essa empresa. A gente foi até lá, fotografou. Tem só uma casa normal. Não se tem informação se lá funciona uma empresa. Não se tem movimentação nenhuma de empresa. Então, isso chamou muito a atenção da gente", explica Welliton Resende.

Cópias do relatório da investigação foram enviados ao TCU, TCE-MA, Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Estado do Maranhão (MP-MA) e Ministério da Educação (MEC).

Recursos

Dois programas tratam de transferências de recursos do governo federal aos municípios para o apoio ao transporte escolar: Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar (Pnate) e o "Caminhos da Escola". "O 'Caminhos da Escola' é aquele onde o governo federal fornece o ônibus para a prefeitura, aquele ônibus amarelo que todo município tem. O segundo é o Pnate (Programa Nacional de Apoio ao Transporte do Escolar), com transferência financeira para apoiar os municípios a fazer o transporte escolar", esclarece o auditor da CGU. A Prefeitura de Bacuri, segundo ele, possui ao menos um micro-ônibus do programa "Caminhos da Escola", que atende as especificações do CTB.

 Exemplo de veículo do programa
Exemplo de veículo do programa "Caminhos da Escola", adequado para o transporte escolar. Foto: Divulgação / Prefeitura Municipal de Sinop.

Os recursos de ambos os programas podem ser utilizados para o aluguel ou compra de veículos, conforme os critérios das prefeituras – que recebem, ainda, recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), dos quais podem destinar até 40% para o transporte escolar.

Questionado pela reportagem do Imirante.com sobre a insuficiência de recursos, o auditor diz que acredita que o volume de recursos não é insuficiente, considerando a realidade de outros municípios do país, já que "além dos dois (programas), a gente tem o Fundeb, que, em boa parte dos municípios do Maranhão, o Fundeb é maior até que o FPM (Fundo de Participação dos Municípios, principal repasse de verbas da União aos municípios, distribuído conforme a proporção em número de habitantes estimados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE)".

Sem fiscalização efetiva, outras tragédias como a de Bacuri podem se repetir. "Os relatórios da Controladoria de 2003 até o último (2013), eles refletem essa realidade: a precariedade absoluta no transporte escolar. Ônibus mal conservados, motoristas desabilitados. É a tônica de boa parte do transporte escolar do Estado", conclui.

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